por Monalisa Torres e Luciana Santana | dez 7, 2020 | Cidades, Destaque 1
Monalisa Torres e Luciana Santana*
Com a finalização do segundo turno em Fortaleza e a vitória do pedetista Sarto é possível identificar com maior clareza o peso dos partidos políticos no Ceará, bem como a força das lideranças no âmbito local. O PDT destaca-se como o principal partido no estado.
Em número de prefeituras, o partido que abriga duas das grandes lideranças do estado, os irmãos Cid e Ciro Gomes, foi o que obteve o melhor desempenho, conforme se pode verificar no gráfico abaixo. Dos 184 municípios cearenses, o partido conquistou 67 prefeituras. Dos cinco maiores colégios eleitorais do estado, a legenda teve sucesso eleitoral na capital, com Sarto Nogueira, e em Sobral, com a reeleição de Ivo Gomes.
Figura 1: Desempenho partidário nas eleições municipais
* Foram considerados no gráfico apenas partidos com lideranças estaduais que ocupam ou ocuparam cargos eletivos no Executivo ou Senado.
O desempenho de PSD, PT e PL
O PSD, legenda que abriga o ex-vice-governador Domingos Filho, é a segunda maior força política no estado e garantiu 27 prefeituras. Embora tenha perdido sua cidade mais importante, Caucaia, do ponto de vista de eleitorado, o PSD teve bom desempenho conquistando importantes colégios eleitorais em cidades de médio porte como Tauá, Quixadá e Iguatu.
O partido do governador Camilo Santana, PT, ampliou o número de prefeituras. Em 2016 elegeu 14 prefeitos. Em 2020 este número subiu para 18, com destaque para a região do Cariri, reduto político de Camilo Lá, o partido venceu a disputa pela prefeitura de Crato, importante colégio eleitoral da região. Itapipoca também foi conquistada pela legenda.
O PL é outro partido que se destacou. Com 13 prefeituras, a agremiação acomoda Acilon Gonçalves, político que tem buscado consolidar seu grupo na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF). Em 2020, Acilon foi reeleito prefeito de Eusébio e seu filho, Bruno Gonçalves, de Aquiraz.
Outras quatro prefeituras serão ocupadas por aliados muito próximos a Acilon: Beberibe, Cascavel, Pindoretama e Itaitinga. Político da base aliada do governo estadual, Acilon sai fortalecido em 2020 e poderá ter lugar na mesa de negociações sobre a sucessão de Camilo Santana em 2022.
Enfraquecimento de MDB e PSDB no Ceará
O MDB, do ex-senador Eunício Oliveira, teve seu pior desempenho. O partido, que já foi a segunda maior força política no Ceará – entre as eleições de 2008 e 2016 – vem perdendo espaço nas prefeituras, conforme pode ser observado na figura 2.
Se em 2016 alcançou a marca de 28 prefeituras, segundo melhor desempenho naquele pleito, em 2020 reduziu para 17. A maior derrota ocorreu na cidade natal e berço político do senador Eunício, Lavras da Mangabeira. Lá, seu sobrinho, Ildsser Alencar (MDB), perdeu a reeleição para Ronaldo da Madeireira (PSD), apoiado por Cid e Ciro Gomes.
Apesar da aproximação do atual governador, após perder a eleição para o Senado em 2018, Eunício, que hoje comanda o MDB no estado, parece ainda não ter encontrado o melhor caminho para fortalecer a legenda.
Pelo histórico de aliados em eleições passadas e considerando os atritos frequentes com Ciro Gomes, não seria surpresa, em 2022, uma composição do MDB de Eunício Oliveira com o novo bloco de oposição que se forma. Não custa lembrar que o ex-senador já concorreu ao governo do estado em 2014, quando teve como principal aliado o PR, então legenda de Wagner e Roberto Pessoa.
Chama atenção o fraco desempenho do PSDB, sigla que abriga o ex-governador e senador Tasso Jereissati. Os tucanos conquistaram apenas quatro prefeituras em 2020. O PSDB já figurou como a mais importante legenda do estado ao longo da Era Tasso, entre as décadas de 1990 a 2000, e arrastava o maior número de prefeituras no interior, chegando a conquistar 83 prefeituras nas eleições municipais de 2000, recorde de desempenho partidário no período da Nova República.
A cidade mais importante a ser administrada pelos tucanos a partir de 2021 será Maracanaú. Município da Região Metropolitana de Fortaleza, com o segundo maior PIB do estado, tem se consolidado como território da oposição. Muito embora Tasso Jereissati tenha selado acordo de apoio à candidatura de Sarto e reaproximado-se dos irmãos Ferreira Gomes, Maracanaú será administrada (novamente) por Roberto Pessoa (PSDB), atualmente uma das vozes mais fortes de oposição ao grupo governista a nível estadual e aliado de primeira hora de Wagner e Girão.
Já os partidos da oposição, PROS e PODEMOS, legendas de Capitão Wagner e Eduardo Girão, levaram três e uma prefeituras, respectivamente. São elas Caucaia (PROS) e São Gonçalo do Amarante (PROS), na região metropolitana, além de Salitre (PROS) e Juazeiro do Norte (PODEMOS), no Cariri.
Sarto vence em Fortaleza com resultado apertado
Com 51,69% dos votos válidos, Sarto foi sagrado o novo prefeito de Fortaleza. Seu adversário, capitão Wagner (PROS), obteve 48,31% dos votos. Importantes fiadores da candidatura pedetista, o prefeito Roberto Cláudio (PDT) e o governador Camilo Santana (PT) saem fortalecidos do pleito.
A previsão era de uma eleição tranquila e favorável ao candidato pedetista, apontada por sondagens eleitorais divulgadas na véspera do pleito (Ibope e Datafolha dos dias 27 e 28 de novembro, respectivamente). No entanto, Fortaleza experimentou a disputa mais acirrada de sua história. A diferença percentual de votos válidos entre os candidatos foi de apenas 3,38%.
Interessante destacar o nível de polarização e nacionalização que marcaram as campanhas no segundo turno. As estratégias e discursos visando ampliação do desgaste do adversário foram expedientes explorados por ambas as candidaturas.
Sarto colocou-se como liderança capaz de unificar diferentes legendas numa “frente suprapartidária de oposição ao bolsonarismo”, que estaria representada na candidatura de Wagner. Este, por seu turno, explorava a associação de Sarto a Ciro Gomes, acusando-o de candidato sem independência política.
Apesar da grande frente que se montou contra Wagner em Fortaleza, sobretudo a partir de um discurso antibolsonarista, a pecha de apadrinhado do presidente Bolsonaro foi relativamente neutralizada pela sua campanha.
Ela conseguiu despersonalizar o apoio do presidente e explorar a importância do prefeito manter boas relações institucionais com o Governo Federal. Em algumas peças publicitárias que circularam na reta final da campanha, por exemplo, críticas pontuais foram tecidas à gestão de Bolsonaro.
E não custa lembrar que capitão Wagner é uma liderança política já consolidada no estado com votações recordes em 2012, 2014 e 2018, quando disputou cargos no legislativo. Sua entrada na política é anterior à emergência de Bolsonaro e sua aproximação com o presidente data de 2018, quando disputou uma vaga à Câmara Federal e montou palanque no Ceará para o então candidato à Presidência da República pelo PSL.
Ainda que tenha sido derrotado em Fortaleza, Wagner e seu grupo saem fortalecidos do pleito. Seu aliado e coordenador de campanha, o senador Eduardo Girão (PODEMOS), que endossou a retórica anti-ferreiragomista, engrossa a oposição no estado e consolida-se como nome forte para a disputa a sucessão de Camilo em 2022.
A diferença de apenas 43.760 votos entre Sarto e Wagner é sintomática do desgaste de um grupo político que há oito anos governa a capital do estado e que, lançando uma candidatura relativamente desconhecida às vésperas da eleição, confiou que a força da máquina e o tamanho da base aliada seriam suficientes para garantir a vitória.
Eleições em Caucaia
Caucaia, segundo maior colégio eleitoral do Ceará, também escolheu seu prefeito na noite de 29 de novembro. O atual gestor, Naumi Amorim (PSD), disputou a reeleição contra Vitor Valim (PROS). Contrariando os institutos de pesquisa, que davam vitória com ampla vantagem a Naumi, Valim foi eleito prefeito de Caucaia com 51,08% dos votos válidos, contra 48,92% do candidato à reeleição.
A disputa, que em muito assemelhou-se aos embates travados no município vizinho, Fortaleza, colocou em polos opostos lideranças da base do governo que apoiaram Amorim e o grupo político liderado por Wagner e Girão.
No saldo geral e considerando as eleições em Fortaleza e Caucaia, a base governista (leia-se o grupo político dos Ferreira Gomes) manteve a hegemonia política, sobretudo pela quantidade de municípios conquistados por partidos e lideranças aliadas. Ganharam em aproximadamente 150 das 184 prefeituras cearenses. Mas vitórias importantes da oposição colocaram novas peças no tabuleiro que se monta para 2022.
Dos cinco maiores colégios eleitorais do estado, o grupo liderado por Wagner e Girão levou três: Caucaia (Vitor Valim, PROS), Maracanaú (Roberto Pessoa, PSDB) e Juazeiro do Norte (Glêdson Bezerra, PODEMOS). Além de São Gonçalo do Amarante (Professor Marcelão, PROS), onde fica o terminal portuário do Pecém. Estas vitórias indicam não apenas o fortalecimento da oposição, dado o peso econômico, eleitoral e simbólico desses municípios, mas revelam também a real possibilidade de alternativa ao grupo dos Ferreira Gomes.
A força política da família Ferreira Gomes
Apesar da hegemonia do grupo político estadual, a relativa fragmentação partidária observada no novo mapa político do Ceará reflete o modelo de composição de alianças ferreiragomistas: a extensa base de apoio com agremiações dos mais distintos matizes ideológicos. Muito diferente do modelo centralizado de decisões no PSDB, marca da Era Tasso.
O modelo ferreiragomista de incorporação de aliados e compartilhamento de poder garantiu não apenas governabilidade como também capilaridade em todo território cearense. Mas impôs a difícil tarefa de acomodar aliados e coordenar interesses divergentes. Cid Gomes tem cumprido esse papel com desenvoltura.
Em 2022, outro desafio deverá se impor ao grupo dos Ferreira Gomes. O fortalecimento de aliados e a sucessão de Camilo Santana, que deixará o Palácio da Abolição muito mais forte politicamente e deverá, mais uma vez, testar a habilidade de articulador do ex-governador Cid Gomes.
*Monalisa Torres é doutora em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará. É professora da Universidade Estadual do Ceará (UECE) e pesquisadora vinculada ao Laboratório de Estudos sobre Políticas, Eleições e Mídia (Lepem/UFC)
Luciana Santana é mestre e doutora em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais, com estância sanduíche na Universidade de Salamanca. É professora adjunta na Universidade Federal de Alagoas (UFAL), é líder do grupo de pesquisa: Instituições, Comportamento político e Democracia, e atualmente ocupa a vice-diretoria da regional Nordeste da ABCP.
por Monalisa Torres e Luciana Santana | nov 22, 2020 | Cidades, Destaque 3
Pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha nos dias 18 e 19 de novembro aponta favoritismo de Sarto (PDT) no segundo turno em Fortaleza. O candidato pedetista obteve 50% da intenção de votos dos entrevistados, enquanto o candidato alinhado a Bolsonaro, Capitão Wagner (PROS), ficou com 36%. 10% dos entrevistados mencionaram a intenção de anular ou votar em branco, e 4% estão indecisos.
Excluindo as intenções de votos não válidos, Sarto teria 59% contra 41% do seu adversário.
Sarto é o candidato da situação e tem o apoio do atual prefeito Roberto Claúdio (PDT), Camilo Santana (PT) e da família dos Ferreira Gomes, que tem se mantido fora dos holofotes.
Ao longo do primeiro turno, Wagner tentou esconder o alinhamento com o presidente, despersonalizando o apoio de Bolsonaro ao se referir às boas relações com o governo federal como necessárias ao futuro gestor da capital cearense.
Como foi o primeiro turno?
A eleição na capital cearense tem sido bastante acirrada desde o início, marcada por uma disputa apertada entre os três primeiros colocados nas pesquisas de intenção de votos.
Os eleitores escolheram Sarto e Capitão Wagner para a disputa do segundo turno, tendo o primeiro recebido 35,72% dos votos e o segundo 33,32%. Luizianne Lins (PT), que nas primeiras sondagens eleitorais aparecia em segundo lugar, após campanha agressiva de adversários, viu seus índices de intenção de votos derreterem e finalizou o primeiro turno com 17,76% dos votos.
Na Câmara Municipal, o PDT foi o grande vitorioso nas eleições na capital cearense. Sozinho, o partido obteve 10 das 43 cadeiras em disputa, quase ¼ do total de vereadores.
O restante das cadeiras ficou dividido entre outros 16 partidos, dos quais sete compõem a coligação governista, totalizando mais 15 vereadores. No resultado geral, além da significativa fragmentação partidária (17 agremiações), já é possível vislumbrar blocos que protagonizarão os embates na Câmara.
O quadro que se montou no legislativo municipal espelhou a polarização e a disputa acirrada entre Sarto e Wagner. O PROS conseguiu cinco cadeiras além de, pelo menos, outras sete de vereadores eleitos por partidos aliados. Personagens que serão importantes cabos eleitorais para ambos os candidatos que se enfrentam no segundo turno.
Apoio, campanha e estratégias
Interessante notar que, antes mesmo de encerrado o período de campanhas no primeiro turno, Wagner já fazia acenos a Luizianne. Ao reconhecer as realizações na gestão da ex-prefeita, busca capturar parcela do eleitorado petista.
A despeito desses acenos, Wagner galvanizou o campo conservador em Fortaleza e, como um dos últimos atos de campanha no primeiro turno, fez lives com lideranças bolsonaristas de segmentos religiosos e não rejeitou o apoio oferecido pelo presidente Bolsonaro. Isso pode dificultar a aproximação com os eleitores de Luizianne na segunda etapa da disputa.
A estratégia de Sarto tem sido a de, mobilizando o embate contra o campo alinhado ao bolsonarismo no Ceará, atrair o eleitorado que rejeita o presidente mirando no voto útil.
47% dos entrevistados na pesquisa Ibope do dia 14 de novembro consideram o governo Bolsonaro ruim ou péssimo, 25% consideram regular e apenas 26% consideram o governo bom ou ótimo.
Camilo Santana: de corpo e alma na campanha de Sarto
A declaração explícita de apoio do governador Camilo Santana (PT) ao candidato pedetista veio na tarde da segunda-feira (16). Em pronunciamento oficial, Camilo reafirmou o compromisso com a democracia e convidou os demais partidos e candidaturas a somarem forças contra o que chamou de “candidato que usou a política da violência para buscar atingir os seus objetivos pessoais”.
O apoio de Camilo tem sido importante para Sarto, pois é visto como um dos principais cabos eleitorais na capital com potencial de transferência de voto e bons índices de aprovação.
Na última pesquisa Ibope, divulgada no dia 14 de novembro, a avaliação do governo estadual aparece como positiva (ótimo/bom) para 56% dos entrevistados. Para 30% o governo tem sido regular e apenas 12% avaliam negativamente (ruim ou péssimo).
O apoio do governador foi disputado tanto por Sarto quanto por Luizianne no primeiro turno. Sem as amarras legais (e morais) que impediam o apoio explícito à Sarto quando Luizianne ainda estava concorrendo, Camilo tem se sentido mais à vontade no segundo turno para participar ativamente dos eventos e programas do pedetista.
Sarto recebe apoio do PT
Quanto ao PT, o partido oficializou apoio à candidatura trabalhista na manhã de terça-feira (17). A Executiva Municipal, por unanimidade, decidiu pelo apoio a Sarto como alternativa ao bolsonarismo na capital. Em nota, o partido afirmou “a responsabilidade política de combater e derrotar o projeto fascista de Bolsonaro (…) representados pela candidatura de Wagner”.
Resta saber em que medida deverá ser o envolvimento do partido na campanha de Sarto, visto o desgaste entre as legendas depois das propagandas ofensivas contra a petista, além das rusgas entre Luizianne Lins e os irmãos Ferreira Gomes.
Apoios a Sarto para frear avanço bolsonarista
Outros candidatos que também disputaram a prefeitura de Fortaleza já se posicionaram. Foi o caso do deputado estadual Heitor Ferrer (SD). Ferrer, que se colocou como candidato independente e sem padrinhos políticos durante todo o primeiro turno, se declarou neutro e não pretende apoiar nenhum dos candidatos que avançaram para o segundo turno.
Com a quarta maior votação (63.199 votos ou 4,93% dos votos válidos), Ferrer parabenizou Sarto e Wagner e afirmou que seu “eleitor caracteriza-se por sua independência e seu discernimento. Ele segue sua consciência e seu juízo de valores. Ele é senhor do seu voto e sabe o que é melhor para a sua cidade. Em respeito a esse eleitor, não iremos aderir a nenhuma candidatura no segundo turno”.
Conforme as expectativas, partidos do campo progressista, como PSOL e PCdoB, declararam-se contrários ao candidato apoiado pelo presidente Bolsonaro. Em nota, o PCdoB afirmou apoiar as candidaturas de Sarto em Fortaleza e de Naumi Amorim (PSD) em Caucaia. Segundo a legenda, é importante marcar posição “para derrotarmos Bolsonaro e seus candidatos nas duas maiores cidades do Ceará. Todo apoio a Sarto em Fortaleza e Naumi em Caucaia”. O candidato do PCdoB, professor Anízio Melo, teve menos de 1% dos votos válidos.
Ao longo das gestões pedetistas na capital cearense, o PSOL sempre esteve no campo da oposição. No entanto, para o segundo turno das eleições, Renato Roseno (PSOL) declarou interesse em “derrotar o bolsonarismo”. O partido confirmou apoio a Sarto, mas sem fechar aliança programática com PDT. Roseno foi o sexto mais votado, com 34.346 votos (2,68% dos votos válidos).
Partidos como PV, PATRIOTA e UP, que disputaram as eleições majoritárias em Fortaleza, engrossaram as fileiras de uma frente partidária antibolsonarista que pode dar musculatura a Sarto.
Esperava-se que o PSL, de Heitor Freire, pela convergência de programas e pautas ideológicas, fechasse apoio a Wagner. No entanto, a sigla preferiu a neutralidade por entender que não se identificava com nenhuma das candidaturas que avançaram ao segundo turno. Freire teve 4,93% dos votos válidos no primeiro turno (65.199 votos).
Abstenção eleitoral e desafios na reta final da campanha
Na reta final da campanha, os candidatos não podem desconsiderar um possível aumento na abstenção eleitoral, seja devido ao contexto pandêmico, seja pela ausência de votação para vereadores, já finalizada no primeiro turno.
O primeiro turno já apresentou aumento em relação à eleições anteriores. Em 2012, a porcentagem de eleitores que não compareceu para votar foi de 16,02%, subindo para 17,04% em 2016 e chegando a 21,84% nesse pleito – o que corresponde a um total de 397.774 eleitores.
Wagner tem o desafio de atrair eleitores dos adversários. O candidato intensificou a agenda de campanhas e mira no eleitorado daqueles que declararam neutralidade. A seu favor, tem uma militância forte e engajada que pode fazer muita diferença nesses últimos dias que antecedem o segundo turno.
Para Sarto, a situação tem sido mais tranquila, entretanto a eleição só se encerra nas urnas. E o eleitor fortalezense gosta de surpreender.
*Monalisa Torres é doutora em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará. É professora da Universidade Estadual do Ceará (UECE) e pesquisadora vinculada ao Laboratório de Estudos sobre Políticas, Eleições e Mídia (Lepem/UFC).
Luciana Santana é mestre e doutora em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais, com estância sanduíche na Universidade de Salamanca. É professora adjunta na Universidade Federal de Alagoas (UFAL), líder do grupo de pesquisa: Instituições, Comportamento político e Democracia, e atualmente ocupa a vice-diretoria da regional Nordeste da ABCP.
Esse texto foi elaborado no âmbito do projeto Observatório das Eleições de 2020, que conta com a participação de grupos de pesquisa de várias universidades brasileiras e busca contribuir com o debate público por meio de análises e divulgação de dados. Para mais informações, ver: www.2020.observatoriodaseleicoes.com.br.
por Monalisa Torres e Luciana Santana | out 31, 2020 | Cidades
Monalisa Torres * Luciana Santana**
Em Fortaleza, três candidaturas têm se mostrado competitivas e disputado vagas para o segundo turno. São elas capitão Wagner (PROS), Luizianne Lins (PT) e José Sarto (PDT).
A primeira pesquisa Datafolha/O Povo, de 17 de outubro, trouxe os seguintes números: Wagner despontava na frente, com 33% das intenções de votos; Luizianne, com 24% das intenções; e em seguida Sarto, que aparecia com 15%.
Já a última pesquisa do mesmo instituto, divulgada no dia 28 de outubro apresenta movimentações no cenário. Sarto dispara e alcança 22%, ultrapassando Luizianne que aparece com 19%. Wagner oscilou para menos, mas continua na liderança com 31% das intenções de voto.
A expectativa era grande em relação à Luizianne, entretanto, dentre os três candidatos, ela é a que apresenta a maior taxa de rejeição, 42%. Capitão Wagner, apoiado por Bolsonaro, é o segundo, 34%, e Sarto tem o menor índice, 20%.
Sarto partiu para o ataque
Com quatro minutos de propaganda eleitoral, o maior tempo de TV/rádio entre todos os candidatos à prefeitura da capital, Sarto tem explorado a imagem de Roberto Cláudio (PDT), atual prefeito, e as parcerias com o governo do Estado. Impedido de usar a imagem do governador Camilo Santana (PT), disputada também pela sua partidária Luizianne Lins, Sarto tem mobilizado outros personagens do entorno do governador, como seu pai, Eudoro Santana, e a vice-governadora Izolda Cela (PDT).
Apesar da tendência de crescimento apontada nas primeiras rodadas de pesquisas, Sarto ainda aparecia atrás de Luizianne Lins. O quadro começou a mudar quando Wagner, em entrevista concedida à TV (programa Ponto Poder Eleições da TV Diário), passou a negar e se eximir da participação nos motins da PM no Ceará em 2020.
Este episódio, já explorado em 23 de outubro neste Observatório, teve reação dura de Camilo Santana, e a partir daí as críticas de Camilo a Wagner passaram a ser frequentes.
Luizianne na mira de Sarto
Os ataques não se limitaram a Wagner. Luizianne também passou a ser alvo da campanha pedetista. Ao longo da semana, em peças com críticas a gestão da petista, comparavam-se os feitos da ex-prefeita com a gestão Roberto Cláudio.
Figura 2 – Trecho de HGPE de Sarto sobre a avaliação da gestão Luizianne Lins
O objetivo era interpelar se o eleitor estaria disposto a dar um “passo para trás, dar um salto no escuro” ou continuar avançando, numa clara referência aos adversários Luizianne e Wagner, respectivamente.
Luizianne tem buscado mobilizar o legado petista em suas campanhas. Apesar de dados divulgados na pesquisa Ibope do dia 14 de outubro que sinalizavam que o apoio de Lula importa para o eleitor da capital, a presença do ex-presidente em seus programas eleitorais ou mesmo a tentativa de colar à imagem de Camilo não conseguiram o efeito desejado.
No domingo, 25 de outubro, Luizianne viajou a São Paulo para gravar programas com Lula. Há ainda expectativas de que o ex-presidente viaje ao Ceará para participar das campanhas da correligionária, mas não há nenhuma confirmação oficial.
Sobre um possível embate entre Bolsonaro e Lula na capital cearense, Luizianne encenou movimentos na pré-campanha. Sobretudo ao se posicionar como antagonista ao que denominou de candidatura bolsonarista, referindo-se a Wagner. Mas a narrativa foi abandonada quando do início das campanhas eleitorais.
Sarto – o candidato que mais cresce nas pesquisas
Sem um candidato natural que pudesse representar a continuidade das gestões do prefeito Roberto Cláudio (PDT), o bloco governista se viu diante do desafio de apresentar uma candidatura competitiva que pudesse fazer frente aos já conhecidos dos fortalezenses: Luizianne (ex-prefeita por dois mandatos) e Wagner (vereador, deputado estadual e federal), adversários nas eleições de 2016 para a prefeitura de Fortaleza.
A escolha recaiu sobre o presidente da Assembleia Legislativa do Ceará (ALECE), José Sarto. Apesar de longa trajetória política, Sarto nunca disputou uma eleição majoritária. O fato de ser um nome relativamente desconhecido pelo eleitor de Fortaleza trouxe vantagens e desvantagens.
Com baixa rejeição, quando comparado aos principais personagens que despontavam no cenário eleitoral, Sarto tem a seu favor os bons índices de aprovação do prefeito e a máquina partidária. Por outro lado, o desafio de conquistar o eleitorado de Fortaleza numa campanha mais curta exigiu intensificar as atividades em diferentes frentes.
Afastado das ruas ainda no dia 5 de outubro, quando foi diagnosticado com Covid-19, coube ao seu maior cabo eleitoral, Roberto Cláudio, a difícil tarefa de mantê-lo vivo nas disputas
Mas, pelo que os dados apontam, as estratégias de campanha negativa de Sarto parecem ter cumprido seu papel. Apesar de não alterar as intenções de voto do Capitão Wagner, que se manteve na casa dos 30%, parece ter contribuído para aumentar sua rejeição. Quem mais sentiu o baque foi Luizianne, com quem disputa o mesmo nicho eleitoral.
Apesar da liderança, situação do capitão não é confortável
Wagner segue liderando as pesquisas de intenção de voto, mas a disparada de Sarto não o deixa em uma situação confortável na reta final da campanha.
Além de não apresentar tendência de crescimento nas pesquisas de intenção de voto e do aumento na taxa de rejeição, o candidato não tem conseguido apresentar argumentos consistentes para responder aos ataques que vem sendo disparados por Sarto e, principalmente, pelo governador Camilo.
Wagner subiu o tom. Peças de campanha do capitão insinuando que o candidato pedetista seria alvo da Operação Lava Jato em 2014 foram veiculadas. Por falta de provas objetivas e conteúdo inverídico, as peças foram suspensas por determinação judicial.
Figuras políticas bolsonaristas ligadas ao capitão apostam em postagens de conteúdo similar. É possível que esse expediente se intensifique e que a rede bolsonarista, que dá suporte a Wagner, tente seguir o caminho adotado na eleição presidencial de 2018, utilizando estratégias de desinformação como arma de campanha, sobretudo em espaços de difícil controle como WhatsApp e Telegram.
Sarto pode continuar em ritmo crescente, e por ter a menor taxa de rejeição, suas chances de crescimento tornam-se maiores. Soma-se a seu favor a associação de Bolsonaro à imagem de Wagner – e não custa lembrar que a rejeição ao presidente é alta em Fortaleza. O apoio do presidente a Wagner pode acionar o “voto útil” em favor de Sarto, voto esse que pode ser o fiel da balança num eventual segundo turno.
As respostas de Luizianne aos ataques miraram Sarto, Roberto Cláudio e não pouparam críticas aos irmãos Ferreira Gomes. Por outro lado, há expectativa de aumento de inserções de vídeos com apoio de Lula e de imagens junto a Camilo Santana.
E quais são os cenários para o segundo turno?
O Datafolha também simulou cenários de segundo turno na capital cearense em sua última pesquisa. De acordo com a opinião dos entrevistados, caso a disputa fosse entre Capitão Wagner e Luiziane, o militar teria 49% e a petista 37%. 13% dos entrevistados responderam que votariam branco ou anulariam e 1% não soube responder.
Capitão Wagner aparece tecnicamente empatado na simulação de segundo turno contra Sarto. Wagner teria 44% e Sarto 43%. 12% dos entrevistadores votariam nulo ou branco e 1% não soube responder. Considerando a margem de erro, neste cenário qualquer um dos dois candidatos poderia ser o prefeito eleito.
Faltam só 15 dias – mas o cenário pode mudar
Nova rodada de pesquisas Ibope/Diário do Nordeste está prevista para os próximos dias e, no meio do caminho, teremos o primeiro debate entre os candidatos. Resta saber se os números se consolidam ou se continuam em movimentação. Parece pouco, mas em 15 dias a situação ainda pode se alterar.
*Monalisa Torres é doutora em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará. É professora da Universidade Estadual do Ceará (UECE) e pesquisadora vinculada ao Laboratório de Estudos sobre Políticas, Eleições e Mídia (Lepem/UFC)
** Luciana Santana é mestre e doutora em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais, com estância sanduíche na Universidade de Salamanca. É professora adjunta na Universidade Federal de Alagoas (UFAL), é líder do grupo de pesquisa: Instituições, Comportamento político e Democracia, e atualmente ocupa a vice-diretoria da regional Nordeste da ABCP.
por Monalisa Torres e Luciana Santana | out 17, 2020 | Cidades, Destaque 1
A eleição municipal na capital cearense tem chamado a atenção especialmente pelo desempenho nas pesquisas de intenção de voto do candidato da oposição, Capitão Wagner (PROS). O candidato, que tem apoio do presidente da república, Jair Bolsonaro, coloca em risco a possibilidade de sucessão do grupo que atualmente está no comando da capital, representado pelo Prefeito Roberto Cláudio (PDT).
Na última pesquisa realizada pelo Ibope/TV Verdes Mares, divulgada no dia 14 de outubro, Capitão Wagner apareceu com 28% das intenções de votos e segue tecnicamente empatado com a candidata Luizianne Lins (PT), que tem 23%. Sarto (PDT) aparece em terceiro lugar com 16%. Os demais candidatos não ultrapassaram 6%.
Fonte: Ibope/ TV Verdes Mares
Desempenho de Capitão Wagner
O deputado federal Capitão Wagner tem forte associação com as corporações militares. Foi o principal líder do movimento paradista dos policiais militares em 2012, quando marcou definitivamente seu papel como antagonista ao então governador Cid Gomes (PDT).
De lá para cá, venceu sucessivas disputas a cargos legislativos, sempre como o mais votado. Eleito vereador em 2012, deputado estadual em 2014 e federal em 2018, Wagner disputou a prefeitura de Fortaleza em 2016 pelo PR, perdendo no segundo turno para o atual prefeito, que disputava a reeleição. Em 2020, o seu bom desempenho nas pesquisas indica que pode ir novamente para o segundo turno.
PDT e PT em Fortaleza
Como em outros momentos da história política de Fortaleza, em 2020 o prefeito Roberto Cláudio não preparou um sucessor que pudesse emergir como candidato natural representando o bloco governista. A dificuldade era acomodar aliados fortes dentro de uma base ampla e com projetos partidários para 2022.
Apesar dos movimentos do atual governador do Ceará, Camilo Santana (PT), a ala petista mais ligada a ex-prefeita Luizianne Lins recusou aliança com o PDT de Roberto Cláudio e dos irmãos Ferreira Gomes, a quem se coloca como opositora desde 2012.
Pelo lado governista, havia a certeza de que a cabeça de chapa deveria ser do PDT, já que o projeto nacional do PDT para 2022 passa, necessariamente, pela conquista da prefeitura de Fortaleza, a quinta maior capital do país.
Dentre os pré-candidatos governistas a prefeitura de Fortaleza em 2020, o nome de Sarto (PDT) aparecia com um dos mais fortes. Atualmente, está em seu sétimo mandato de deputado estadual, é presidente da Assembleia Legislativa do Ceará (ALECE) e trabalhou muito próximo ao governador Camilo Santana nos episódios recentes das crises de segurança pública e sanitária. Político de carreira, possui excelente trânsito entre os partidos que compõem a base aliada, além de ter construído boas relações na Câmara de Municipal de Fortaleza (CMF).
A indicação do vice de Sarto foi avalizada por Camilo Santana. A opção recaiu no ex-secretário da Casa Civil do governo do estado, o sociólogo e pessebista Élcio Batista, homem de confiança do governador.
O PT tentou aproximação com o MDB de Eunício Oliveira, mas os acordos não avançaram. O insucesso de compor alianças com outras legendas forçou o PT a lançar candidatura pura. Isolado, o partido oficializou Luizianne Lins e Vladyson Viana (PT), nome ligado ao deputado federal José Guimarães (PT).
Apoios políticos nacionais na disputa
A pesquisa Ibope também sondou a influência do presidente Jair Bolsonaro e do ex-presidente Lula no voto do fortalezense. Para apenas 14% dos entrevistados, o apoio de Bolsonaro contaria muito na decisão do voto. Já para outros 33%, o apoio de Lula aumentaria muito as chances de voto em um candidato. Isso indica um recall positivo em relação aos governos petistas na capital cearense.
Os respondentes também foram consultados sobre a influência de Ciro Gomes (PDT) e Roberto Cláudio. Para 14%, o apoio de Ciro Gomes conta muito e 18% consideram muito importante o apoio do atual prefeito, que aparece com 49% de avaliação ótima e boa.
E o apoio do governador Camilo?
Apesar da pesquisa Ibope também sondar o apoio de lideranças políticas, como o caso do atual governador do Ceará, sobre o voto do eleitor de Fortaleza, é importante ressaltar que, desde a redemocratização a dinâmica eleitoral de Fortaleza tem se mostrado “imune” a influência do governador. Nem mesmo Tasso Jereissati (PSDB), no auge de seu poder, conseguiu emplacar candidaturas a prefeito na capital.
Mas, pela primeira vez, o apoio do governador parece ter importância nas disputas em Fortaleza. Duas candidaturas disputam o apoio de Camilo Santana, que tem 56% de aprovação segundo Ibope. De acordo com a pesquisa, 20% afirmaram votar em um candidato indicado pelo governador.
A boa avaliação de Camilo e o desempenho de seu governo na gestão da pandemia são fatores que podem contribuir para uma melhorar a intenção de votos em Sarto e Luizianne. Ambos tem feito menções ao governador em propagandas eleitorais veiculadas na primeira semana. Apesar de afirmar neutralidade no primeiro turno das eleições em Fortaleza, Camilo Santana fez sinalizações de seu apoio a Sarto.
Luizianne, partidária do governador, chegou a dizer que trabalhará “em parceria com o companheiro Camilo Santana” e reivindica o direito de explorar o “legado petista” a nível federal e estadual.
Eleição indefinida
Apesar das movimentações, ainda é cedo para cravar os nomes dos candidatos que chegarão ao segundo turno na disputa pelo comando da capital.
*Monalisa Torres é doutora em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará. É professora da Universidade Estadual do Ceará (UECE) e pesquisadora vinculada ao Laboratório de Estudos sobre Políticas, Eleições e Mídia (Lepem/UFC)
** Luciana Santana é mestre e doutora em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais, com estância sanduíche na Universidade de Salamanca. É professora adjunta na Universidade Federal de Alagoas (UFAL), líder do grupo de pesquisa: Instituições, Comportamento político e Democracia, e atualmente ocupa a vice-diretoria da regional Nordeste da ABCP.