Análise: Boulos tem espaço para subir e ir ao segundo turno em SP

Oswaldo E. do Amaral

Neste 2020 muito louco, finalmente as eleições municipais estão entrando no radar dos eleitores. Ocupados em resistir ao vírus, à crise econômica e às polêmicas da turma do Palácio do Planalto, demorou para os eleitores passarem a prestar atenção nas corridas locais até mesmo nas grandes cidades. Agora, a pouco mais de 20 dias das eleições, a coisa começa a esquentar.

No dia 22, o Datafolha divulgou mais uma pesquisa para a disputa na cidade de São Paulo. O quadro parece mais incerto agora. Celso Russomano (Republicanos), como esperado, caiu de 27% das intenções de voto, em pesquisa realizada nos 05 e 06, para 20%. O atual prefeito, Bruno Covas (PSDB), oscilou de 21% para 23%, assim como Guilherme Boulos (PSOL), que passou de 12% para 14%, e Márcio França (PSB), que foi de 8% a 10%.

Candidatura do PSOL é a novidade em SP

Em um pleito em que um candidato do PSDB está bem posicionado e em que Celso Russomano larga na frente e vai derretendo ao longo da campanha, a principal novidade está na figura de Boulos, líder do MTST, como o principal nome da esquerda na disputa, desbancando um posto historicamente ocupado por candidatos petistas.

Com uma ex-petista histórica como candidata a vice, Luiza Erundina (PSOL), e com pouco tempo de propaganda eleitoral gratuita, a campanha de Boulos vem se destacando até aqui pela capacidade de tocar em temas tradicionais da esquerda com bom-humor e criatividade, fazendo os mais saudosistas do início da transição democrática lembrarem de quando o publicitário Carlito Maia estava no PT.

Ao analisarmos os dados do Datafolha mais detalhadamente, é possível concluir que ainda há espaço suficiente para que a candidatura do PSOL chegue em um eventual segundo turno, provavelmente, contra Bruno Covas. Vejamos.

Na pesquisa espontânea, em que os entrevistados respondem sem que lhes seja apresentada a lista de candidatos, Boulos está com 11% da intenção de votos, tecnicamente empatado com Russomano (11%) e Bruno Covas (13%), e à frente de Márcio França (5%), indicando uma solidez no apoio obtido até aqui.

No entanto, diferentemente de seus competidores diretos no momento, Boulos não é conhecido, nem mesmo de ouvir falar, por 43% dos eleitores. Russomano e Covas são conhecidos por todo o eleitorado, enquanto França é conhecido por 79%.

Com relação à taxa de rejeição, os números são um pouco piores, mas ainda não chegam a inviabilizar seu crescimento. O líder do MTST é rejeitado por 24% dos entrevistados, bem abaixo dos 38% de Russomano e empatado com o atual prefeito, com índice de 25%. No entanto, nesse aspecto, a vantagem de Covas é grande, pois ele já conta com o conhecimento de todo o eleitorado.

Os desafios

Para chegar ao segundo turno, porém, Boulos e o PSOL terão que vencer alguns desafios. O primeiro é ampliar a exposição do candidato. Nesse sentido, a pouca quantidade de debates em veículos de comunicação de grande alcance podem ser uma barreira. Depender exclusivamente das redes sociais pode não ser o suficiente para que sua candidatura chegue aos mais velhos, aos mais pobres e aos de menor escolaridade, exatamente os segmentos em que o candidato tem seu piores desempenhos.

Outro desafio é conseguir colocar-se como a principal alternativa de esquerda ao PSDB na capital paulista. Aqui, a batalha é dupla: por um lado, Boulos vai precisar mostrar-se viável eleitoral e politicamente. Ou seja, demonstrar que terá condições políticas de governar a cidade mesmo sendo, inicialmente, líder de um governo minoritário na Câmara; por outro lado, o candidato terá que convencer uma grande parte dos petistas (16% do eleitorado) de que é uma alternativa mais viável do que Jilmar Tatto (PT). Por enquanto, o líder do MTST vem sendo bem-sucedido nessa empreitada. Na pergunta espontânea, 17% dos que se identificam com o PT preferem o candidato do PSOL, contra apenas 11% que preferem Tatto. Um terço dos petistas não soube se posicionar.

Por fim, Boulos vai precisar levar sua candidatura à periferia, em especial aos extremos das Zonas Leste e Sul, tradicionais redutos da esquerda que migraram para partidos de centro nas últimas eleições municipais.

Os desafios são grandes, mas não será surpresa se a esquerda voltar a contar com um candidato no segundo turno da maior cidade do país.

Nota: os dados usados neste artigo estão disponíveis no site do Datafolha.

Direita larga na frente nas capitais

Direita larga na frente nas capitais

Nos últimos dias, várias análises, algumas delas publicadas neste Observatório das Eleições, destacaram o avanço das candidaturas de partidos de direita em 2020, sugerindo que a onda política conservadora que tomou conta do país em 2018 ainda não teria terminado.

Iniciada a corrida eleitoral de 2020, como andam as disputas nas capitais por bloco ideológico? A direita está mesmo em posição de vantagem? Com base em pesquisas publicadas nos últimos dias em 21 capitais já é possível traçar um panorama.

Como foi em 2016

Em 2016, a direita venceu em 5 capitais (19%), o centro, em 12 (46%), e a esquerda, em 9 (35%). O MDB com vitórias em quatro capitais e o PSDB, com sete triunfos, comandaram o protagonismo dos partidos de centro. Na esquerda, o PDT levou três capitais e o PSB, duas. O PT, em forte crise, venceu apenas em Rio Branco. O PSD liderou o bloco da direita, com conquistas em João Pessoa e em Campo Grande.

MDB e PSDB animaram-se com os resultados. Tudo parecia convergir para o sucesso em 2018 da coalizão que derrubara Dilma Rousseff. No entanto, esse não era o plano dos líderes da Operação Lava-Jato. Em 2017, MDB e PSDB foram alvos de denúncias e investigações. Com o objetivo de mostrar imparcialidade e de “sanear” o sistema político brasileiro, os “revolucionários” de Curitiba implodiram as ambições nacionais dos principais partidos de centro e abriram espaço para a ascensão de Jair Bolsonaro – uma consequência inesperada de todo o processo, talvez (?). O resto é história. Os principais partidos da Nova República ficaram marcados pelos escândalos de corrupção e perderam espaço para a “nova” direita conservadora.

Mesmo considerando as diversas dinâmicas locais, esse processo ainda parece em curso, especialmente entre as elites políticas, que se reorganizaram bastante entre 2017 e 2020.

Em 2020, a direita está na frente

Até o momento, é possível analisar as corridas eleitorais em 21 capitais a partir de pesquisas divulgadas por meios de comunicação. O que temos então? Partidos de direita lideram em onze (52%), de centro, em 5 (24%), e de esquerda, em 5 (24%).

O DEM está na frente em quatro capitais (Salvador, Rio de Janeiro, Curitiba e Florianópolis), seguido pelo PSD (Campo Grande, Goiânia e Belo Horizonte) e pelo PSDB (Palmas, Rio Branco e Natal). No bloco de esquerda, a dispersão é grande, com PT, PSOL, PDT, PC do B e PSB liderando, cada um, em uma cidade.

Já ganhou?

Ainda falta tempo para o primeiro turno e os eleitores vêm tomando decisões cada vez mais perto do dia de ir à urna. No entanto, em algumas capitais as disputas parecem bem encaminhadas e podem terminar ainda na primeira volta. Em Salvador, Curitiba e Florianópolis, Bruno Reis, Rafael Greca e Gean Loureiro, os três do DEM, contam com mais de 40% das intenções de voto, segundo o Ibope. Nada, porém, se compara ao desempenho de Alexandre Kalil (PSD) em Belo Horizonte. O ex-presidente do Atlético Mineiro e atual prefeito aparece com 56% das intenções de voto segundo a última sondagem do Datafolha.

O Triângulo das Bermudas

Desde a Nova República, apenas em 2016 nenhum partido de esquerda venceu nas capitais de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo, o chamado Triângulo das Bermudas da política brasileira. O evento parece que vai se repetir em 2020. Em nenhuma das três cidades, candidatos de esquerda estão entre os dois primeiros colocados.

Falta tempo ainda para as eleições municipais, e muito mais tempo para 2022. O quadro atual, no entanto, não parece favorável aos partidos de esquerda.

Candidatos na liderança das disputas nas capitais

  • Belém: Edmilson Rodrigues (PSOL)
  • Manaus: Amazonino Mendes (Podemos)
  • Palmas: Cinthia Ribeiro (PSDB)
  • Rio Branco: Minoru Kinpara (PSDB)
  • Aracaju: Edvaldo Nogueira (PDT)
  • João pessoa: Cícero Lucena (PP)
  • Maceió: Alfredo Mendonça (MDB)
  • Natal: Álvaro Dias (PSDB)
  • Recife: João Campos (PSB)
  • Salvador: Bruno Reis (DEM)
  • São Luis: Eduardo Braide (Podemos)
  • Campo Grande: Marquinhos Trad (PSD)
  • Cuiabá: Emanuel Pinheiro (MDB)
  • Goiânia: Vanderlan Cardoso (PSD)
  • Belo Horizonte: Alexandre Kalil (PSD)
  • Rio de Janeiro: Eduardo Paes (DEM)
  • São Paulo: Celso Russomanno (Republicanos)
  • Vitória: João Coser (PT)
  • Curitiba: Rafael Greca (DEM)
  • Florianópolis: Gean Loureiro (DEM)
  • Porto Alegre: Manuela D’Ávila (PCdoB)

Nota metodológica

Esquerda: PC do B; PDT; PMN; PSB; Psol; PT; Rede
Centro: (P)MDB; PSDB; PPS/Cidadania
Direita: DEM; PHS; Podemos; PP; PRB/Republicanos; PSD

E agora, PT?

E agora, PT?

Lá atrás, em 1986 (que hoje parece ser no século 13), Emir Sader organizou um livro exatamente com esse nome. Mais uma vez, o Partido dos Trabalhadores (PT) discutia seus rumos e como agir na Nova República que se iniciava. Nenhuma novidade para um partido fundado a partir de diversos grupos e com forte disputa interna. O tempo passou e a história todo mundo conhece: o partido abraçou a institucionalidade, moderou o discurso e a prática e governou o país entre 2003 e 2016.

Agora, um novo dilema se coloca. Se em 2018, com o ex-presidente Lula preso, o PT foi bem-sucedido em se manter como a principal força política de esquerda e de oposição ao futuro governo, fazendo a maior bancada na Câmara e disputando o segundo turno das eleições presidenciais, agora o desafio reaparece de forma mais difícil.

Pressionado a compor uma frente com outras forças de oposição e a abrir mão de liderar o bloco de centro-esquerda, o pleito de 2020 é muito importante para as pretensões do partido em 2022. São dois os principais desafios: evitar o viés de queda verificado nas últimas eleições municipais, quando o partido elegeu menos vereadores e prefeitos do que o Partido Socialista Brasileiro (PSB), por exemplo, e demonstrar ter recuperado capilaridade organizativa em todo o território nacional nos últimos quatro anos.

Os dados das últimas eleições locais mostram o tamanho do problema. Em 2016, pela primeira vez na sua história, o partido elegeu menos vereadores e prefeitos do que na eleição anterior. Em 2012, o partido conquistara 11% das prefeituras e 9% das vagas nas câmaras municipais. Ainda venceu em 17 cidades com mais de 200 mil eleitores. Quatro anos depois, o partido ganhou em apenas uma grande cidade e em cerca de 5% dos municípios brasileiros, elegendo também cerca de 5% de vereadores.

Para além disso, o partido perdeu capilaridade. Na Ciência Política, usamos o lançamento de candidatos a vereador como uma medida para saber se o partido existe no nível local. Entre 2004 e 2012, o PT lançou candidatos em cerca de 90% dos municípios, rivalizando com o rei da capilaridade, o (Partido) do Movimento Democrático Brasileiro (MDB). Em 2016, a máquina petista encolheu: o partido concorreu em pouco mais de 70% dos municípios, disputando o terceiro lugar com o Partido Progressista (PP), Partido Social Democrático (PSD) e Partido Socialista Brasileiro (PSB), atrás do (P)MDB e do Partido da Social-Democracia Brasileira (PSDB).

Os mapas abaixo dão cores a esse movimento. Nas eleições para prefeito e vereadores, quanto mais branco o mapa, menos municípios contaram com a participação do PT nas disputas. Da mesma forma, quanto mais fracas as cores nos mapas, menores as porcentagens de votos obtidos pelo PT.

O PT será capaz de reverter esse quadro iniciado em 2016? Essa é uma pergunta que começará a ser respondida nesta semana, quando tivermos os dados consolidados das candidaturas. A resposta final, porém, só no dia 15 de novembro. Não custa lembrar que o mundo vive também de coincidências. Em 1989, foi nesse mesmo dia que o então candidato Lula superou Loenel Brizola por menos de 500 mil votos e marcou a ascensão do PT como principal partido de esquerda do país. E nesse 15/11?