Uma das possibilidades abertas pelo resultado das eleições de 2018 era a de manutenção da onda ultra conservadora no país, puxada pelo prestígio de Jair Bolsonaro, com reflexos na eleição de 2020. Esse não parece ser mais o caso.

O atual presidente perdeu aliados desde então. Em especial entre setores liberais, nas turmas do mercado e da Lava Jato. Guedes é hoje um ministro enfraquecido e o governo sonha em furar o sacrossanto teto de gastos. Moro se foi e a agenda do Planalto nesta área se resume em tentar conter os danos causados pela família e agregados.

Muitos sonharam, outros tiveram pesadelos, com um exército bolsonarista “puro sangue” disposto a tomar prefeituras pelo país afora – o tempo no Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral e os 199 milhões de reais do PSL no fundo eleitoral ajudariam bastante. Mas o Presidente rompeu com o partido, viu sua bancada na Câmara rachar ao meio e fracassou na viabilização da alternativa, a Aliança pelo Brasil. Em uma palavra, um desastre: afinal, o melhor caminho para assumir protagonismo em uma eleição é ter um partido à mão.

Bom, mas agora temos não um, mas os vários partidos do Centrão, um bloco no qual, segundo o General Heleno, se “gritar pega ladrão (…)”. Cultura musical a parte, a aproximação com o Centrão foi articulada em um contexto em que se temia o impeachment e pode evoluir para algo mais amplo, mas não resolve a falta de instrumentos eleitorais. O problema é que a fragmentação partidária, associada à proibição de coligações nas eleições proporcionais e a uma cláusula de desempenho de 2% em 2022, tende a acirrar a competição entre os partidos.

Dito de outro modo, nestas eleições todas as legendas serão ainda mais incentivadas a preservar e ampliar suas bases obedecendo estritamente a cálculos locais. Isso complica a convivência eleitoral entre os membros do Centrão, bem como entre estes e outros tantos partidos de perfil conservador, e tende a limitar os movimentos do Planalto. O cenário pode tornar-se mais claro onde houver segundo turno. Mesmo assim o apoio de Bolsonaro dependerá de não haver conflito entre partidos do Centrão ou entre estes e um candidato de perfil igualmente conservador.

Nesse caso, cabe perguntar se Bolsonaro seria um bom cabo eleitoral. Pelo que sabemos, a população encontra-se dividida quanto à atuação do Presidente na pandemia. Na pesquisa DataFolha realizada em agosto, 47% o isentaram de responsabilidade pelas mais de cem mil mortes, 11% o consideraram o principal culpado e 41% lhe atribuíram alguma culpa. Na XP/Ipespe, realizada entre 8 e 11 de setembro, 49% consideraram sua atuação na pandemia ruim ou péssima, 28% ótima ou boa e 19% regular.

No que diz respeito à avaliação do governo, pela primeira vez desde agosto de 2019 a avaliação positiva supera a negativa nas duas pesquisas citadas e na mais recente do Ibope (17 a 20 de setembro), com o percentual de ótimo/bom variando de 37% a 40%. A pesquisa Ibope revela também que 50% aprova a maneira do Presidente governar, ainda que em sete das nove áreas de atuação pesquisadas o percentual dos que desaprovam supere o dos que aprovam com diferenças que vão de 8 a 39 pontos.

Uma pesquisa do DataFolha para a cidade de São Paulo (realizada em 21 e 22 de setembro) mostra que apenas 11% votariam com certeza em um candidato à Prefeitura indicado pelo Presidente, enquanto 64% não votariam de jeito nenhum. Cabe lembrar que, na pesquisa de agosto do mesmo instituto, apenas 22% diziam confiar sempre no presidente e 41% afirmavam não confiar nunca – nas seis pesquisas anteriores do Instituto a média do que disseram nunca confiar foi de 40,6% e dos “confiantes” 20,3%. A diferença entre estes índices e os de aprovação, na pesquisa de agosto, salta aos olhos e permite afirmar que se o auxílio emergencial impactou na avaliação do governo, não se pode dizer o mesmo sobre a confiança no presidente.

Tudo somado, dois pontos ficam claros. Em primeiro lugar, o fiasco da Aliança pelo Brasil fez com que na errática estratégia de Bolsonaro para 2022 a eleição municipal ficasse relegada a um papel residual. Em segundo, quando vier a ocorrer, o mais provável é que uma sinalização do Presidente funcione como variável definidora do voto apenas entre seus apoiadores mais fiéis, o que seria chover no molhado. Mas, é claro, a depender da situação – de que município se trata e do grau de competitividade da disputa – este apoio de Bolsonaro pode influenciar no resultado.