Antipetismo versus experiência administrativa

Antipetismo versus experiência administrativa

Leonardo Avritzer*

As eleições do último domingo geraram análises contraditórias e de diferentes tonalidades no que diz respeito aos resultados da esquerda e, em particular, do Partido dos Trabalhadores (PT). De acordo com os dados do TSE, comparando os votos recebidos no primeiro turno de 2016 e 2020, o PT recebeu 11.740 votos a mais nessas eleições na avaliação mais conservadora, sem contar Macapá, onde não o pleito ainda não se realizou, e com algumas disputas ainda sob judice. Percentualmente ele recebeu uma fração maior devido à alta abstenção neste último domingo.

Mesmo com a performance ruim para prefeito na cidade de São Paulo e as coalizões em Belém e Porto Alegre, o partido demonstra uma leve recuperação em relação a 2016. No que se refere à capital paulista, se levarmos em conta que o PT fez a maior bancada de vereadores na cidade e que uma parte considerável do eleitor petista identificou-se com a candidatura de Boulos (PSOL), podemos apontar uma recuperação do PT, ainda que parcial.

Cabe destaque que nas câmaras municipais das capitais o PT cresceu e passou de quarenta para cinquenta vereadores. Foi o segundo partido, atrás apenas do Republicanos, que fez 53 vereadores.

O antipetismo, contudo, parece não ter sido completamente superado, continuando forte nas regiões sul e sudeste. Em pesquisa realizada na última semana de outubro pelo Instituto da Democracia e da Democratização da Comunicação (INCT Democracia), percebemos a continuidade do antipetismo nestas regiões. No Brasil como um todo, 26% dos respondentes afirmou não votar em candidatos do PT. Na região sudeste, o antipetismo alcança 30%. Ainda assim, se olharmos a série histórica, os dados são menos contundentes do que em 2018.

No entanto, gostaria de analisar um dado que me parece ainda mais importante: os resultados das eleições em cidades grandes e de porte médio com segundo turno. Neste caso, notamos um fenômeno adicional que merece análise: a forte presença do PT nas cidades da região sul e sudeste.

Na lista de prefeituras com candidatos petistas que disputarão o segundo turno no dia 29 de novembro, temos nove cidades da região sul e sudeste. Estas cidades têm algumas características em comum: já foram governadas pelo PT (apenas Juiz de Fora é exceção) e têm políticos com forte tradição de eficiência administrativa. Pepe Vargas em Caxias do Sul (RS), Marília Campos em Contagem (MG), João Coser em Vitória (ES) e Filippi em Diadema (SP) têm essa caraterística que aponta na direção de uma mudança de postura no eleitorado. Onde os eleitores conhecem o candidato, o antipetismo parece ser contido pela busca de experiência administrativa.

Quadro 1: Cidades com candidatos do PT disputando segundo turno

Dois elementos adicionais apontados pelos dados são importantes: em primeiro lugar, a diferença entre 2016 e 2020 no quesito experiência administrativa dos candidatos do PT. O partido disputa o segundo turno em 2020 em oito cidades a mais do que em 2016, lembrando que ele foi derrotado em todas as sete cidades nas quais disputou segundo turno na eleição de quatro anos atrás. Além disso, em nenhuma dessas, o seu candidato havia liderado a disputa. Assim, temos de fato uma mudança que vale a pena ser observada: o PT encontra-se em primeiro lugar em sete das quinze cidades, sem contar Belém, onde é parte da coalização que lidera nas pesquisas.

A segunda questão que também parece relevante consiste em saber se o resultado positivo deve-se a pessoas ou administrações exitosas no passado. Tomo aqui três exemplos, um em cada região: Caxias do Sul (RS), Contagem (MG) e Vitória da Conquista (BA). O caso mais emblemático é Vitória da Conquista, governada pelo PT entre 1996 e 2016. Alí um ex-prefeito teve mais votos do que o atual prefeito e quase se elegeu no primeiro turno. Algo parecido ocorreu em Contagem e Caxias. Políticos com muita experiência foram os preferidos pela população. Assim, é possível dizer que se o antipetismo das duas últimas eleições continua entre nós, mas ele parece ter um fator moderador: a busca pelo bom governo e pela experiência administrativa.

Quais são os segredos de Kalil

Quais são os segredos de Kalil

Alexandre Kalil (PSD) está entre os grandes vencedores desta eleição. Político com estilo próprio, não foi gerado e nem nutrido em nenhum dos grandes partidos. Tem se destacado desde a sua eleição para prefeito de Belo Horizonte, em 2016. 

Duas características o diferenciam de quase todos os candidatos da atual onda de antipolítica: de um lado, Kalil preocupa-se com políticas públicas e resgata a tradição de atuação eficiente nesse campo criada pelo Partido dos Trabalhadores (PT) na cidade desde 2003. De outro, adere a movimentos contra o establishment político e aproxima-se dos candidatos neopentecostais na Câmara dos Vereadores. Até a eleição deste domingo (15), Belo Horizonte tinha 13 pastores evangélicos vereadores. Kalil foi responsável pela eleição deles, mas não hesitou nenhum minuto em enfrentá-los quando foi necessário. 

Alexandre Kalil parece ser dos poucos políticos que consegue ter um pé em cada um dos mundos da polarização política que existe no Brasil hoje. E isso lhe dá apoio popular.

Examinemos um pouco mais as políticas públicas da era Kalil. O prefeito reeleito em Belo Horizonte assumiu a Prefeitura no auge da crise econômica. Seu antecessor penalizou fortemente as políticas sociais para a população mais pobre nos dois primeiros anos da crise. 

No início da sua administração, Kalil aproximou-se de políticos petistas com forte tradição na área de políticas sociais e com isso reconstruiu políticas sociais importantes na cidade. Aumentou o número de equipes que lidam com a população de rua e conseguiu melhorar uma situação de crise, ao reabrir o restaurante popular fechado por Márcio Lacerda (sem partido). 

Kalil também seguiu a tradição existente em BH ao propor o novo Plano Diretor Municipal que diminui fortemente a possibilidade de construção na parte central da cidade reduzindo o coeficiente de aproveitamento das áreas urbanas para 1,0. 

O plano, que foi gerado na IV Conferência Municipal de Política Urbana, recebeu a oposição de toda a área de especulação imobiliária da cidade, mas o prefeito seguiu em frente reforçando uma concepção construída em parceria com entidades da sociedade civil. 

Quando olhamos Belo Horizonte pelo lado das políticas públicas, percebemos o porquê do sucesso de Kalil. Ele deu continuidade a um conjunto de iniciativas herdeiras da gestão do ex-prefeito Patrus Ananias (PT). Graças a isso não representou uma polarização com o eleitorado de esquerda na cidade.

Ao mesmo tempo, Kalil adotou uma política de enfrentamento verbal com a esquerda, especialmente com o PT, e de cooptação pontual da sua base de apoio conservadora na Câmara dos Vereadores. 

No momento da votação do Plano Diretor Municipal na Câmara, quando o prefeito enfrentava a ira da poderosa Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) e do lobby das grandes empresas de engenharia da cidade, ele negociou pontualmente com a bancada evangélica a retirada de limitações para a construção e reforma em templos religiosos. Igrejas e templos foram excluídos do pagamento da outorga onerosa, a taxa que construções acima do coeficiente de 1,0 são obrigados a pagar. 

O maior conflito de Kalil com a bancada evangélica deu-se em torno do projeto da “Escola Sem Partido”. Aprovado na Câmara dos Vereadores de Belo Horizonte em primeiro turno, até hoje não foi votado em segundo turno. Kalil conseguiu diminuir a velocidade da tramitação do projeto sem se opor abertamente a ele e o projeto acabou não sendo votado. Assim, uma proposta que entornaria o caldo na relação entre prefeito e bancadas conservadoras na Câmara foi posto em banho maria e provavelmente não terá apoio na próxima legislatura.

Kalil foi dos poucos políticos brasileiros que conseguiu equilibrar-se na polarização brasileira. Mas foi durante a pandemia que ele reforçou sua concepção de independente, tendo sido ali que fortaleceu a imagem de eficiente na implementação de políticas públicas. 

Belo Horizonte foi a primeira grande capital a fechar o comércio e conseguiu ter baixos índices de transmissão do coronavírus até o início de junho. Foi também uma das poucas capitais a reverter a abertura do comércio no mês de julho, quando Kalil foi fortemente atacado pela Associação Comercial. Sua resistência aos lobbies de direita lhe valeram o apoio de parte da esquerda. 

O segredo de Kalil é implementar agendas de esquerda e conseguir compor pontualmente com os interesses conservadores da cidade. A esquerda fica feliz porque sua agenda é implementada. E a direita fica feliz porque tem acesso ao prefeito e compõe pontualmente em causas de interesse próprio que é a grande agenda dos setores conservadores em nosso país.

Eleições municipais de 2020 serão menos ideológicas

Eleições municipais de 2020 serão menos ideológicas

Existem eleições municipais cujo resultado é determinado pela dinâmica local e eleições que são atravessadas pela dinâmica nacional. O pleito de 2016 foi nacionalizado devido ao impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff e a Operação Lava Jato. A eleição de 2020 será diferente. Os dados da pesquisa “A Cara da Democracia: Eleições 2020” indicam uma dinâmica baseada em dois elementos: despolarização e recompensa aos bons administradores que, nesse momento, tendem a ser os prefeitos que combateram a COVID-19. Além disso, há sinais de dinâmicas distintas entre cidades médias e capitais.

Em 2016, o Partido dos Trabalhadores (PT) conseguiu eleger apenas um prefeito entre as cem principais cidades do país. Foi punido nas urnas, enquanto o Movimento Democrático Brasileiro (MDB) e o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) foram recompensados pelo eleitorado, convencido pela narrativa mediática de que seriam partidos distantes das denúncias de corrupção. Essa narrativa prevaleceu até maio de 2017, quando foram divulgadas as gravações de Michel Temer e Aécio Neves.

As eleições de 2020 terão outras dinâmicas. Primeiro, foram tornadas locais devido à atuação dos prefeitos na pandemia, segundo os dados da pesquisa A Cara da Democracia. Os números sobre desempenho não deixam margem para dúvidas: a atuação do presidente é vista como ruim ou péssima por 42% dos brasileiros. Os dados sobre desempenho dos governadores se mostram só um pouco melhores. São os prefeitos que se destacam nessa pandemia com 41% de avaliações ótimas/boas e 33% regulares (vide Gráfico 1). A dinâmica local será determinada por esse fato. Eleitores e eleitoras estão mais interessados na administração da sua cidade do que nos grandes debates nacionais e votarão de acordo com o desempenho das ações anti-pandemia no nível local.

Gráfico 1: Desempenho de Bolsonaro, governadores e prefeitos na pandemia

Essa tendência ao local tem uma segunda faceta: sinais de despolarização que também diminuem a influência de atores nacionais sobretudo nas grandes cidades.

Mesmo sabendo que o governo Bolsonaro tem melhorado sua avaliação desde o mês de junho, vale a pena apontar que os dados sobre suas ações durante a pandemia não melhoraram e tudo indica que esse é um dos motivos pelos quais ele não será uma influência importante nestas eleições.

O ex-presidente Lula não é, tampouco, um grande influenciador em 2020, em especial nas regiões Sul e Sudeste. Lula tem uma rejeição menor do que a do presidente Jair Bolsonaro, sobretudo entre aqueles que respondem que não votariam em um candidato apoiado por ele de jeito nenhum. No entanto, a distância entre Lula e Bolsonaro fica na margem de erro nesse quesito. É na região Nordeste onde Lula segue sendo um grande cabo eleitoral e onde praticamente duas em cada três pessoas poderiam votar em alguém indicado por ele, tal como mostra o gráfico abaixo.

Gráfico 2: Votaria em candidato apoiado por Lula por regiões

Cabe, por fim, notar uma diferença significativa entre capitais e cidades médias. Bolsonaro não consegue influenciar as eleições nas grandes cidades como Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Recife e Porto Alegre. Pode-se dizer o mesmo em relação a Lula, com duas diferenças fundamentais: a primeira delas é o peso do PT nas capitais nas quais o partido apoia um candidato ou candidata de esquerda, Belém e Porto Alegre. A segunda diferença se deve à relevância de candidaturas petistas em cidades de porte médio. Há aqui, porém, um elemento que não tem sido muito comentado: os petistas Marília Campos, em Contagem, Elói Pietá, em Guarulhos, Antônio Gomide, em Anápolis, e Pepe Vargas, em Caxias do Sul, estão em primeiro lugar nas pesquisas devido a fortes sucessos administrativos no passado. Isso reforça o argumento de que, nesta eleição, mais vale o bom trabalho local do que as bravatas contra a pandemia que, no final, desorganizaram o país e sua resposta à pandemia.

A pesquisa “A Cara da Democracia: Eleições 2020”, do INCT-Instituto da Democracia e da Democratização da Comunicação e do Cesop/Unicamp foi realizada entre os dias 24 de outubro e 04 de novembro de 2011. A pesquisa entrevistou duas mil pessoas por telefone, tem grau de confiança de 95% e margem de erro de 2,2%.

A disputa entre o DEM e o bolsonarismo nas eleições

A disputa entre o DEM e o bolsonarismo nas eleições

As forças de centro-direita foram as principais derrotadas nas eleições de 2018, em especial o PSDB e o DEM, que concorreram coligados na candidatura de Geraldo Alckmin. No entanto, alguns meses depois das eleições de 2018, os Democratas (DEM) já haviam recuperado influência política a despeito da derrota eleitoral. É interessante observar que, à exceção de Rodrigo Maia – cuja liderança da Câmara já é consolidada desde o governo Michel Temer –, nos demais casos o que agiu foi a fortuna.

Davi Alcolumbre era um político desconhecido até a ascensão do bolsonarismo. O principal candidato a presidente do Senado em 2019 era Renan Calheiros, que foi derrubado por uma campanha do bolsonarismo nas redes sociais pela abertura dos votos dos senadores. A presidência do Senado caiu do nada nas mãos de um político desconhecido e o Democratas inesperadamente passou a controlar as duas casas do Congresso.

No início de 2020, o DEM encontrou-se em situação inédita, detendo a presidência das duas casas e com o único político de capaz de desafiar a popularidade de Jair Bolsonaro, o ex-ministro da saúde, Henrique Mandetta. Ele agora parece estar se posicionando muito bem nas eleições de 2020.

A tabela 1 abaixo aborda as seis capitais nas quais os candidatos do DEM têm mais de 10% das intenções de voto segundo pesquisas do Ibope e do Datafolha.

Tabela 1:Candidatos do Democratas nas capitais com mais de 10% de intenções de voto

Podemos notar um processo interessante que vale a pena analisar: a concentração das candidaturas de direita ou de centro direita no DEM e a forte tendência à reeleição dos seus candidatos mais fortes. Em primeiro lugar, o DEM não parece estar ameaçado nas três capitais que ele governa: Salvador, Florianópolis e Curitiba. Em todos estes casos, seus candidatos têm mais de 40% de intenção de voto.

Nos outros casos, candidatos da centro direita se aproximaram do DEM vindo de outros partidos, o que aponta na direção de uma certa hegemonia do DEM na centro direita. O caso mais relevante parece ser o do Rio de Janeiro, onde Eduardo Paes saiu do MDB, outro partido de centro fortemente derrotado em 2018, e está concorrendo pelo DEM. Paes encontra-se em primeiro lugar, na frente do atual prefeito Marcelo Crivella que é apoiado por Jair Bolsonaro.

A ascensão do DEM enquanto representante da centro direita contrasta com a incapacidade de candidatos do campo bolsonarista motivarem o eleitorado e colocarem-se em uma posição confortável na disputa eleitoral. A tabela 2 mostra a dificuldade da direita bolsonarista em importantes cidades nestas eleições.

Tabela 2: Candidatos apoiados por Bolsonaro em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte

Na tabela estão os candidatos apoiados por Jair Bolsonaro em três capitais (São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte) tendo ou intenção de voto muito baixa ou perdendo apoio.

O que podemos perceber é que Bolsonaro não é um grande eleitor nas capitais em que há apenas alguns meses antes estavam batendo panelas nas varandas contra a sua política sanitária. Nenhum dos seus candidatos está bem colocado nas maiores cidades. Pelo contrário, a candidatura de Celso Russomano parece estar derretendo apesar do apoio do presidente, o mesmo acontecendo com a candidatura de Marcelo Crivella no Rio de Janeiro. Por último, o candidato de Bolsonaro contra o prefeito que mais se distanciou das políticas do presidente na pandemia, o prefeito de Belo Horizonte, parece não ter nenhuma chance nessa eleição.

Assim, vemos dois fenômenos diferentes: de um lado, não há indicações de que o eleitorado tenha se movido em direção à esquerda desde 2018, ainda que ela possa ter vitórias importantes em 2020, se as pesquisas de Porto Alegre e Recife estiverem certas. De outro, observa-se um movimento de moderação no conservadorismo que parece estar desaguando em candidatos do Democratas e não naqueles apoiados pelo presidente Bolsonaro.

Assim, o resultado das eleições de 2020, a se manter a tendência da pesquisa Datafolha de 22 de outubro, é de maior equilíbrio entre Bolsonaro e o DEM. Se o presidente parece manter um nível de popularidade alto, em especial se levarmos em conta o desastre da sua política sanitária e o número de mortos no país, ele também  parece ter perdido um dos seus principais ganhos de 2018: o benefício da dúvida que lhe foi dado pelo eleitorado de classe média das grandes capitais.

Como nas principais democracias do mundo, o eleitorado brasileiro está optando por um poder dividido, ao invés de transferir todo o seu poder a um candidato ou a um clã que não se mostrou nem democrático, nem eficiente em combater a pandemia e nem capaz de gerir a economia.

Combater a pandemia dá votos?

Combater a pandemia dá votos?

Desde as eleições de 2016, é possível observar um padrão de voto por parte do eleitor brasileiro, tanto em eleições municipais quanto em eleições estaduais. Como resultado de uma crítica ao establishment político e aos partidos, esse eleitor passou a se preocupar muito mais com a aparência física dos candidatos e com certo discurso anticorrupção e não se atentou muito à capacidade que os vereadores, deputados, prefeitos e até mesmo governadores eleitos teriam de formular e implantar políticas.

Uma pergunta importante para a eleição de 2020 é se esse padrão irá ou não mudar em virtude da pandemia do novo coronavírus. Afinal vimos tanto experiências de forte empenho no combate à pandemia quanto prefeitos e governadores que se eximiram de adotar medidas contundentes e não foram capazes de controlá-la.

Belo Horizonte e Florianópolis: aparentemente imbatíveis

Temos motivos para assumir que o padrão irá se alterar a partir de 2020. Ainda que não em todos os lugares. Alguns exemplos já podem ser percebidos, como o caso do prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD), e do prefeito de Florianópolis, Gean Loureiro (DEM).

Alexandre Kalil foi um dos prefeitos a implementar as políticas mais radicais contra o coronavírus, tornando Belo Horizonte a primeira cidade a adotar medidas de isolamento social, em 17 de março, como também uma das poucas a retornar ao isolamento em virtude do aumento da taxa de contaminação após a abertura do comércio.

Até hoje, a capital mineira não reabriu completamente seus restaurantes e escolas. O prefeito de BH, mesmo com implementação de políticas tão incisivas de combate à pandemia, disparou na frente de outros candidatos na corrida eleitoral pela reeleição. De acordo com a pesquisa IBOPE do dia 02 de outubro Kalil possui 56% das intenções de voto.

Situação semelhante ocorre em Florianópolis, onde o atual prefeito tem 44% de votos e seu desempenho contra a pandemia vem sendo bem avaliado pela população. No entanto, uma pergunta ainda se coloca: os casos dos prefeitos de Belo Horizonte e de Florianópolis são casos isolados ou seria um novo padrão a ser observado nas eleições deste ano?

Combate a pandemia parece ser relevante, mas não sozinho

Comparando a atuação de alguns prefeitos a partir de três critérios, a saber, a política em relação à reabertura do comércio, em relação a restaurantes e escolas e seus posicionamentos públicos, podemos avaliar a reação à pandemia entre intensa, média, baixa e muito baixa. Na tabela abaixo, observa-se também a intenção de voto.

Tabela 1: intenção de voto e reação à pandemia

Os casos marcados em verde-escuro apontam para aqueles prefeitos que tiveram atitudes incisivas no combate à pandemia. Os dois mencionados anteriormente, Alexandre Kalil (Belo Horizonte) e Gean Loureiro (Florianópolis), são praticamente imbatíveis, segundo os números atuais. Dados os impactos e a relevância do tema sanitário na conjuntura, isso indica certo alinhamento da população às atitudes dos prefeitos.

As certezas, no entanto, acabam aí. Por um lado, o caso de Bruno Covas já levanta algumas dúvidas sobre essa correlação. O prefeito paulistano, que em 2016 foi vice de João Dória, agora está como candidato pelo PSDB e em segundo lugar na pesquisa, perdendo apenas para Russomano (Republicanos) que tem 26% dos votos. Ainda que esteja perdendo para um candidato apoiado pelo presidente Jair Bolsonaro, figura que teve uma atuação na pandemia contrária ao que aqui consideramos como exemplar, o prefeito tem chances de reeleição dado o histórico de perda de fôlego de Russomano.

Por outro lado, há dúvidas se a péssima intenção de votos em relação ao prefeito Marcelo Crivella (Republicanos) deve-se unicamente a sua atuação frente à pandemia. Provavelmente não, já que ele acumulava um desempenho muito ruim em um conjunto de áreas de sua administração antes mesmo do início da pandemia.

Resta explicar, portanto, os casos intermediários. Prefeitos que antes da pandemia eram frágeis e tiveram atitudes médias – apontando para mais de uma direção em termos de medidas intensas e de pouca atenção à severidade da crise – parecem ter os maiores problemas em relação a corrida eleitoral.

Esse é o caso principalmente do atual prefeito de Porto Alegre e candidato à reeleição, Nelson Marchezan Júnior. Corre contra ele um processo na Câmara dos Vereadores por desviar recursos de combate à Covid-19 para outras áreas. Recife teve um momento muito ruim no início da pandemia mas se recuperou bem ao passo que Porto Alegre tem um desempenho ruim que se manteve, especialmente se comparado às duas outras capitais da região Sul.

Vale a pena também apontar a baixíssima taxa de reeleição no estado do Rio Grande do Sul e que deve também afetar Marchezan, um candidato que se beneficiou da onda de boa aparência somada ao discurso anticorrupção em 2016, mas que parece não conseguir se reeleger apenas com base neste binômio.

Por último, temos um caso que não se enquadra completamente em nossa tipologia, que é Cuiabá. Por um lado, o desempenho frente à Covid–19 do prefeito Emanuel Pinheiro parece ser muito ruim, mas, por outro lado, ele tem alta intenção de votos. O caso de Cuiabá mostra que a pandemia é relevante, mas não foi e não será capaz de ser o único item nas agendas das eleições deste ano. Continuarão existindo pautas e lideranças regionais. Porém, aqueles prefeitos que conseguiram associar um bom desempenho anterior com um bom desempenho na gestão da pandemia parecem ter maiores chances de reeleição.