por Carlos Ranulfo | out 29, 2020 | Destaque 3, Geral, Opinião Pública
Tem sido comum afirmar que o DEM desponta como a principal força de centro nas eleições municipais. De fato, o DEM tem apresentado um bom desempenho nas capitais. Mas a questão aqui é saber se seria correto caracterizá-lo como um partido de centro.
Para isso, analiso a opinião de deputadas e deputados sobre como posicionar os partidos, e mostro que o DEM é tido como o partido mais à direita dentre os analisados, ainda que tenha feito um percurso em direção ao centro.
Esquerda e direita
A distinção entre esquerda e direita surgiu na Revolução Francesa, quando os partidários do rei na Assembleia Nacional sentavam-se à direita e os simpatizantes da revolução, à esquerda. A partir do século XIX, a distinção associou-se à clivagem capital/trabalho e o termo esquerda passou a designar os partidos socialistas, comunistas ou social democratas.
Contemporaneamente, aceita-se que os dois campos são caracterizados em função da atitude frente à igualdade: para a esquerda, a desigualdade entre os indivíduos é artificial e deve ser enfrentada pela ação estatal; para a direita, as desigualdades mais importantes entre os indivíduos são naturais e são mais bem enfrentadas pela ação do mercado.
Esquerda e direita na Câmara dos Deputados
A classificação dos partidos em uma escala esquerda-direita sempre causa controvérsia. Neste artigo, considera-se a opinião dos deputados e deputadas na Câmara. Os dados são provenientes do projeto, “Representação política e qualidade da democracia” conduzido pelo Centro de Estudos Legislativos da UFMG.
São consideradas as cinco últimas legislaturas. Em cada uma foram feitas 125 entrevistas em amostras que levaram em conta o tamanho das bancadas. Foi solicitado, aos deputados e deputadas que posicionassem os maiores partidos em uma escala, onde 1 significava esquerda e 10 direita. As respostas foram categorizadas em “esquerda” (1-4); “centro” (5-6) e “direita” (7-10). O resultado é mostrado na Figura 1.
Figura 1
Fonte: Representação política e qualidade da democracia (CEL-DCP/UFMG)
No geral, as posições se mantêm no tempo com pequenas variações. A exceção fica por conta do PT, posicionado cada vez mais à esquerda, indo de 3,9 na primeira legislatura a 2,3 na última. PSB e PDT mantiveram-se no limite entre as posições de esquerda e de centro. MDB e PSDB também ocuparam uma posição limite, mas entre o centro e a direita.
Finalmente, os partidos à direita, PP e DEM, fizeram um percurso em direção ao centro – de forma mais clara no primeiro caso (de 7,9 para 6,4) do que no segundo (de 7,6 para 7,0). A série não inclui o PSL, dada a sua inexpressividade até a eleição de 2018. Na atual legislatura, o partido foi incluído na lista de legendas apresentada aos deputados(as), que o alocaram na posição 7,5.
Estado ou mercado?
Em função do modo como veem a possibilidade de redução das desigualdades sociais, é de se esperar que partidos de esquerda prefiram fortalecer a presença do Estado. Para verificar se isso procede, deputadas e deputados dos maiores partidos foram questionados sobre: (a) se seriam favoráveis a uma economia regulada pelo Estado ou pelo mercado; (b) qual deveria ser o controle do Estado sobre a gestão dos serviços públicos; e (c) qual deveria ser o controle do Estado sobre os recursos naturais. Foi utilizada a escala de 1 a 10 onde 1 significava máxima presença do Estado.
A figura 2 apresenta os resultados para a atual legislatura. A posição dos partidos em cada uma das três questões foi definida com base nas respostas dadas por seus representantes eleitos, extraindo-se daí a média, que é o valor associado a cada legenda na Figura.
Como se observa, PSB e PDT ficam mais próximos do MDB, o que deixa o PT relativamente isolado na defesa de posições mais estatais. Praticamente não há distinção entre o PSDB e o bloco mais claramente “pró-mercado” que, por sua vez, é capitaneado pelo DEM, a legenda mais “neoliberal” de todas, com média de 7,4 nas três questões.
Figura 2
Fonte: Representação política e qualidade da democracia (CEL-DCP/UFMG)
Progressistas ou conservadores?
Para verificar se partidos de esquerda seriam também mais progressistas (e vice versa) foram utilizadas questões sobre redução da maioridade penal, união entre pessoas do mesmo sexo, pena de morte, descriminalização do uso de drogas, proibição da venda de armas e aborto. Na escala utilizada, 1 significava uma postura progressista e 10 conservadora. A posição de cada partido, na Figura 3, corresponde a uma média das respostas dadas por seus deputados ou deputadas.
Figura 3
Fonte: Representação política e qualidade da democracia (CEL-DCP/UFMG)
Parece que, pelo menos na Câmara, a esquerda é mais progressista, ainda que PSB e PDT novamente se aproximem do MDB. Sem surpresa, o PSL é o mais conservador, “trocando de posição” com o DEM, em relação à figura anterior. Surpresa talvez seja o PSDB que, de acordo com seus deputados, é tão ou pouco mais conservador que partidos tradicionalmente considerados como tal no Brasil.
Moral da história
À medida que uma nova geração substituiu os velhos caciques do antigo PFL, o DEM de fato moderou algumas de suas posições, mas é mais correto deixá-lo onde sempre esteve, à direita, ainda que não tão longe do centro. O surgimento de uma direita mais radical e reacionária, personificada em Bolsonaro e seus filhos, não deve fazer com que tudo o que não seja esquerda passe a ser denominado centro.
por Monize Arquer e Luiz Gabriel de Lima | out 26, 2020 | Destaque 3, Opinião Pública
No próximo dia 15 de novembro, teremos eleições nos mais de cinco mil municípios brasileiros, mas muitos poderão acordar com o mesmo prefeito em 1º de janeiro de 2021. A reeleição consecutiva para cargos do Executivo foi aprovada em 1997 por meio de emenda constitucional, e desde então isso tem sido padrão. Ou seja, boa parte dos ocupantes do cargo levaram vantagem sobre os concorrentes durante os pleitos e permaneceram em seus cargos.
No entanto, a taxa de sucesso de prefeitos que buscam um segundo mandato vem caindo desde 2008. Mas isso pode se reverter esse ano. O número de candidatos com a intenção de conquistar a reeleição aumentou e as eleições municipais de 2020 tem o maior número de prefeitos aptos à reeleição desde 2000 – a primeira disputa eleitoral municipal depois que a recondução foi permitida. Hoje, mais da metade dos prefeitos tentam um segundo mandato.
“A política só tem uma porta, a porta de entrada. Não tem porta de saída” – José Sarney
No final do mandato, políticos devem decidir entre se ausentar da disputa seguinte, concorrer a um cargo diferente daquele que ocupam ou buscar a reeleição. Caso decidam permanecer no cenário político, isso pode ser feito por meio do mesmo partido pelo qual foi eleito na disputa anterior ou por um novo. Para o cargo de prefeito, a regra permite apenas uma reeleição consecutiva. Já para vereador, não existem impeditivos para a reeleição.
Sendo assim, é importante saber quem são esses candidatos que buscam permanecer no cenário político e se é possível identificar estratégias para a disputa eleitoral que irão enfrentar.
Caras conhecidas em 2020
Do total de candidatos que disputam as eleições para prefeito em 2020, 31% já competiram por essa vaga em 2016 e, no caso dos vereadores, quase 29% do total de candidatos já pleitearam pela vaga nas eleições anteriores.
É possível imaginar que a maior recorrência de candidaturas seja entre postulantes que foram eleitos em 2016, e isso vale para os prefeitos. Em aproximadamente 60% dos municípios brasileiros, os prefeitos estão buscando uma nova vitória nessas eleições. Mas, dado o maior número de candidatos em disputa, entre os vereadores essa condição se inverte. Cerca de 70% dos candidatos que não foram eleitos em 2016 estão disputando novamente uma vaga nas Câmaras Municipais.
Outro dado interessante é que do total de candidatos a prefeito esse ano, quase 17% foram candidatos a vereador em 2016, dentre os quais, 71% foram eleitos naquele pleito. Ou seja, o aumento no número de candidaturas para as prefeituras é composto por indivíduos já conhecidos no cenário político municipal, o que pode ser uma vantagem para aqueles que buscam essa vaga.
Migração entre candidatos a vereador é grande
Um ponto que vale ser ponderado a respeito das candidaturas repetidas é a migração partidária. Além de pensar de qual partido o candidato vem e para qual foi, é igualmente importante ponderar o que essa movimentação significa. Por um lado, certamente, temos estratégias partidárias que visam atrair essas candidaturas a fim de ampliar sua atuação nacional. Mas, por outro, também existe a agência do indivíduo que opta por permanecer no mesmo partido ou não.
Entre os prefeitos, é mais comum que aqueles que estão eleitos busquem uma nova candidatura pelo mesmo partido. Mas entre os vereadores isto não parece ser tão frequente. Mais de 60% dos vereadores que estão se candidatando novamente e que foram eleitos em 2016 apostam em uma nova legenda para as eleições 2020, e entre os que se candidataram, mas não foram eleitos, esse valor ultrapassa os 70%.
Mas como escolher para onde ir? Os incentivos para a migração partidária são vários, e não cabe aqui discuti-los. Neste observatório, foi discutido já o efeito do fim das coligações nos cargos proporcionais, que certamente fez com que a decisão de vereadores sobre partidos encontrasse novos elementos para poderar.
Mas um ponto que vale a pena questionar é se, nesse cálculo, entra a ponderação sobre o partido do governador. Isso porque, a presença no principal cargo Executivo do estado poderia gerar maior visibilidade, recursos e até mesmo facilidades durante a campanha eleitoral. E, de um modo geral, parece que esse é um atrativo.
Os governadores importam
Entre candidatos que se candidataram para prefeito em 2016 e estão tentando novamente, 13,4% estão no partido do governador de seu estado e, dentre esses, 41% estavam em um partido diferente na eleição anterior. Entre os vereadores, 9% estão disputando pelo mesmo partido que o do governador e, desse total, quase 65% migrou para esse partido para concorrer em 2020. Sobre isso, chama atenção o caso de São Paulo, onde o PSDB domina a disputa pelo governo do estado há mais de 20 anos e, ainda hoje, segue atraindo muitos competidores para sua sigla em comparação com os que acontece nos demais estados.
Ainda não dá para saber se essa é uma estratégia eficiente, precisamos aguardar o resultado da disputa. Mas já podemos adiantar que, provavelmente, haverá muitos rostos conhecidos em janeiro de 2021.
Monize Arquer é doutora em Ciência Política pela Unicamp, com período sanduíche na Universidade de Oxford, e pesquisadora do Centro de Estudos de Opinião Pública (Cesop – Unicamp). Atualmente atua em estágio pós-doutoral no INCT/IDDC.
Luiz Gabriel Lima é graduando em Ciências Sociais pela Unicamp e bolsista do INCT/IDDC.
por Oswaldo E. do Amaral | out 24, 2020 | Cidades, Destaque 3, Opinião Pública
Oswaldo E. do Amaral
Neste 2020 muito louco, finalmente as eleições municipais estão entrando no radar dos eleitores. Ocupados em resistir ao vírus, à crise econômica e às polêmicas da turma do Palácio do Planalto, demorou para os eleitores passarem a prestar atenção nas corridas locais até mesmo nas grandes cidades. Agora, a pouco mais de 20 dias das eleições, a coisa começa a esquentar.
No dia 22, o Datafolha divulgou mais uma pesquisa para a disputa na cidade de São Paulo. O quadro parece mais incerto agora. Celso Russomano (Republicanos), como esperado, caiu de 27% das intenções de voto, em pesquisa realizada nos 05 e 06, para 20%. O atual prefeito, Bruno Covas (PSDB), oscilou de 21% para 23%, assim como Guilherme Boulos (PSOL), que passou de 12% para 14%, e Márcio França (PSB), que foi de 8% a 10%.
Candidatura do PSOL é a novidade em SP
Em um pleito em que um candidato do PSDB está bem posicionado e em que Celso Russomano larga na frente e vai derretendo ao longo da campanha, a principal novidade está na figura de Boulos, líder do MTST, como o principal nome da esquerda na disputa, desbancando um posto historicamente ocupado por candidatos petistas.
Com uma ex-petista histórica como candidata a vice, Luiza Erundina (PSOL), e com pouco tempo de propaganda eleitoral gratuita, a campanha de Boulos vem se destacando até aqui pela capacidade de tocar em temas tradicionais da esquerda com bom-humor e criatividade, fazendo os mais saudosistas do início da transição democrática lembrarem de quando o publicitário Carlito Maia estava no PT.
Ao analisarmos os dados do Datafolha mais detalhadamente, é possível concluir que ainda há espaço suficiente para que a candidatura do PSOL chegue em um eventual segundo turno, provavelmente, contra Bruno Covas. Vejamos.
Na pesquisa espontânea, em que os entrevistados respondem sem que lhes seja apresentada a lista de candidatos, Boulos está com 11% da intenção de votos, tecnicamente empatado com Russomano (11%) e Bruno Covas (13%), e à frente de Márcio França (5%), indicando uma solidez no apoio obtido até aqui.
No entanto, diferentemente de seus competidores diretos no momento, Boulos não é conhecido, nem mesmo de ouvir falar, por 43% dos eleitores. Russomano e Covas são conhecidos por todo o eleitorado, enquanto França é conhecido por 79%.
Com relação à taxa de rejeição, os números são um pouco piores, mas ainda não chegam a inviabilizar seu crescimento. O líder do MTST é rejeitado por 24% dos entrevistados, bem abaixo dos 38% de Russomano e empatado com o atual prefeito, com índice de 25%. No entanto, nesse aspecto, a vantagem de Covas é grande, pois ele já conta com o conhecimento de todo o eleitorado.
Os desafios
Para chegar ao segundo turno, porém, Boulos e o PSOL terão que vencer alguns desafios. O primeiro é ampliar a exposição do candidato. Nesse sentido, a pouca quantidade de debates em veículos de comunicação de grande alcance podem ser uma barreira. Depender exclusivamente das redes sociais pode não ser o suficiente para que sua candidatura chegue aos mais velhos, aos mais pobres e aos de menor escolaridade, exatamente os segmentos em que o candidato tem seu piores desempenhos.
Outro desafio é conseguir colocar-se como a principal alternativa de esquerda ao PSDB na capital paulista. Aqui, a batalha é dupla: por um lado, Boulos vai precisar mostrar-se viável eleitoral e politicamente. Ou seja, demonstrar que terá condições políticas de governar a cidade mesmo sendo, inicialmente, líder de um governo minoritário na Câmara; por outro lado, o candidato terá que convencer uma grande parte dos petistas (16% do eleitorado) de que é uma alternativa mais viável do que Jilmar Tatto (PT). Por enquanto, o líder do MTST vem sendo bem-sucedido nessa empreitada. Na pergunta espontânea, 17% dos que se identificam com o PT preferem o candidato do PSOL, contra apenas 11% que preferem Tatto. Um terço dos petistas não soube se posicionar.
Por fim, Boulos vai precisar levar sua candidatura à periferia, em especial aos extremos das Zonas Leste e Sul, tradicionais redutos da esquerda que migraram para partidos de centro nas últimas eleições municipais.
Os desafios são grandes, mas não será surpresa se a esquerda voltar a contar com um candidato no segundo turno da maior cidade do país.
Nota: os dados usados neste artigo estão disponíveis no site do Datafolha.
por Monize Arquer e Oswaldo Amaral | out 20, 2020 | Destaque 1, Opinião Pública
As eleições municipais obedecem a lógicas locais. Essa é uma máxima muito comum entre os analistas políticos e é, em grande medida, verdadeira. Descolados das eleições gerais, questões e temas municipais tendem a dominar as discussões nas disputas para prefeituras e câmara de vereadores.
No entanto, políticos e partidos não disputam as eleições municipais pensando apenas nelas. Pensam também em suas carreiras e em como ampliar as chances de sucesso em seus eventuais mandatos e eleições futuras. Ou seja, há um pedaço da estratégia que está conectado com dinâmicas políticas que estão além das questões locais.
Ao analisarmos os dados de lançamento de candidaturas para prefeitos e vereadores entre 2000 e 2020 por bloco ideológico (esquerda, centro e direita), é possível observar movimentos compatíveis com a distribuição de poder em nível nacional.
Esquerda cresceu entre 2000-2012
Entre 2000 e 2012, houve um crescimento na porcentagem de candidaturas dos partidos de esquerda no país tanto para as prefeituras como para as câmaras dos vereadores. Em boa medida, isso reflete o aumento da capilaridade do PT no período. Ocupando o governo federal desde 2003, o partido ampliou os incentivos para a migração de políticos e para a abertura de diretórios no interior do Brasil. Desde 2016, porém, os partidos de esquerda perderam espaço e apresentaram queda na proporção de candidatos lançados.
A crise que levou ao impeachment de Dilma Rousseff e a subsequente conquista do governo federal por um presidente abertamente hostil a qualquer partido de esquerda reduziram os incentivos para os candidatos locais se lançarem por esses partidos.
O PSB e o PV, por exemplo, estão entre os partidos que mais perderam candidatos que disputam novamente as eleições em 2020. Entre os que mais obtiveram ganhos, nenhum partido é de esquerda.
Os partidos de centro mantiveram o viés de queda verificado desde os anos 2000. Ou seja, não se beneficiaram da nova conjuntura política do país e perderam espaço entre 2016 e 2020 para partidos de direita.
O PSDB, por exemplo, assim como os partidos mencionados, está entre as agremiações que mais perderam candidatos que disputam novamente a eleição em 2020. O destino preferido, neste caso, foi o PSD, legenda que já nasceu com alguma força eleitoral por ter atraído lideranças importantes do cenário político e que segue buscando ampliar sua capilaridade no interior do país.
Direita ganhou espaço a partir de 2016
Entre 2000 e 2008, houve uma pequena queda na porcentagem de candidatos de partidos de direita. A partir de 2016, no entanto, houve um crescimento expressivo na porcentagem de candidatos que pertencem a esse bloco ideológico. Em 2020, quase 60% dos candidatos a vereador e a prefeito estão filiados a partidos de direita – recorde na série entre 2000 e 2020. O DEM foi o partido que mais se beneficiou com a migração de candidatos que disputaram as eleições de 2016, seguido pelo PP e pelo PSD.
Quando observamos os dados por UF, vemos que o crescimento das candidaturas em partidos de direita é generalizado em todo o Brasil. Apenas no Rio Grande do Norte, há menor proporção de candidatos de partidos de direita em 2020 do que em 2016 nas disputas para as prefeituras. Para as câmaras dos vereadores, em apenas quatro estados (BA, CE, RN e RR) não houve aumento da proporção de candidaturas por legendas de direita.
Os dados mostram duas coisas: (a) as eleições locais não se restringem apenas a dinâmicas políticas locais; (b) no cálculo de políticos e lideranças partidárias, de uma maneira geral, candidatar-se por um partido de direita na atual conjuntura política do Brasil, parece aumentar as chances de sucesso.
A julgar pelas preferências dos políticos, a direita larga na frente para 2022. Agora resta combinar com os “russos”: os eleitores, a partir de 15 de novembro.
Nota metodológica
Os partidos foram classificados da seguinte forma:
Esquerda – PCdoB, PCB, PCO, PDT, PMN, PPL, PROS, PSB, PSOL, PSTU, PT, PV, Rede e UP.
Centro – MDB, PPS, PSDB.
Direita – Novo, PAN, Patriota, PTB, DEM, PGT, PHL, PL, PMB, PP, PRN, PR, PRB/Republicanos, Prona, PRP, PRTB, PSC, PSDC/DC, PSL, PST, PTdoB/Avante, PTC, PTN/Podemos, Solidariedade.
por Lucas Gelape | out 15, 2020 | Destaque 2, Geral, Opinião Pública, Sem categoria
Eleições são momentos cruciais para as democracias. É por meio delas que escolhemos nossos representantes, consentimos em sermos governados e garantimos a legitimidade dos governos.
A ocorrência de desastres naturais apresenta um dilema: como e quando realizar eleições nessas situações? Por um lado, o adiamento de eleições torna a ida às urnas mais segura. Por outro, as datas e procedimentos escolhidos podem afetar os resultados, e adiamentos podem levar a crises de legitimidade.
Até a data de elaboração deste texto, 72 países e territórios haviam decidido adiar alguma eleição por causa da pandemia, de acordo com levantamento do Instituto para Democracia e Assistência Eleitoral (IDEA, em sua sigla em inglês). O mesmo levantamento mostra que 67 países e territórios realizaram eleições ao longo desse período. Essas disputas nos permitem antecipar o que esperar neste contexto.
Quais os impactos da realização de eleições durante a pandemia?
Estudos discutiram ao menos dois aspectos: o comparecimento às urnas e o desempenho dos detentores de cargos.
Em geral, o comparecimento em eleições realizadas neste período foi menor do que a média nesses países ao longo de 12 anos (2008-2019), segundo outro estudo do IDEA. Porém, ao menos 12 casos foram exceções.
O IDEA elenca três fatores relacionados ao aumento do comparecimento nessas exceções: (1) o fortalecimento de arranjos especiais de votação, como o voto por correio ou o voto antecipado; (2) o contexto político, com disputas mais apertadas ou cruciais para o destino de uma região; e (3) o momento em que a eleição ocorreu, já que locais pouco afetados pela Covid-19 durante as eleições tiveram bom comparecimento (como na Eslováquia e em Togo).
No Brasil, há risco de redução no comparecimento. A Justiça Eleitoral pretende mitigar este problema e reduzir o risco aos eleitores implementando uma série de medidas, como a ampliação do horário de votação, horário preferencial para idosos, equipamentos de proteção para mesários e disponibilização de álcool em gel para eleitores. Contudo, tais medidas ficam aquém de alguns arranjos especiais descritos no relatório, que exigiriam transformações profundas no processo eleitoral brasileiro.
Além disso, apesar da possibilidade do contexto político afetar eleições em algumas cidades, a disputa de 2020 não dá sinais de que isso seja generalizado (vale a ressalva de que, no Brasil, eleições locais têm um comparecimento maior do que as gerais).
Quanto ao momento da eleição, apesar de passarmos por uma redução no número diário de casos e mortes pela Covid-19, a situação da pandemia ainda é grave. Pesquisas do Ibope em 13 municípios mostram que, levando em conta a situação da pandemia e as medidas de prevenção, entre 69% e 79% dos eleitores dizem que irão às urnas com certeza (número abaixo do comparecimento nacional em 2016, que foi de 82,4%), enquanto entre 15% e 24% afirmam ter dúvidas sobre seu comparecimento.
As eleições em outros países e as pesquisas citadas ainda mostram que a queda não deve ser igual em todos os segmentos do eleitorado, o que pode influenciar no resultado de algumas disputas.
Figura: Percentual de eleitores que “com certeza comparecerá para votar”
E quanto aos resultados?
Meses atrás, analistas identificaram um aumento substantivo na avaliação de líderes mundiais, atribuindo-o ao efeito de união nacional, no qual a população se une em torno de seus líderes num momento de crise. Damien Bol e coautores mostraram que um lockdown estava associado a aumento de intenção de voto para o partido do Primeiro-Ministro na Europa Ocidental, atribuindo-o a este efeito.
Porém, ele não é sempre encontrado. Em estudo sobre as eleições locais na Baviera (Alemanha), Arndt Leininger e Max Schaub argumentam que a relação positiva entre o número de casos de Covid-19 e o voto no partido governante não refletia esse efeito, pois somente os candidatos da CSU (principal partido na região) se beneficiaram, enquanto outros partidos mandatários perderam votos.
Roberto Ramos e Carlos Sanz ainda chamam atenção para a duração deste efeito. Ao estudarem queimadas naturais na Espanha, o efeito positivo delas em votações de partidos da situação se restringiu aos meses mais próximos à eleição. Por aqui, já convivemos com a pandemia há vários meses. Apesar da melhora na avaliação de prefeitos e governadores no início deste período, há dúvidas se ele persiste e terá consequências nas urnas.
Sobre o Brasil, George Avelino lançou duas hipóteses sobre fatores que devem favorecer prefeitos que buscam a reeleição: o maior destaque deles ao longo deste período, com resultados concretos para a população; e as restrições a campanhas presenciais, especialmente em municípios pequenos onde as interações face-a-face são mais importantes.
Em análise neste Observatório, a partir das pesquisas de intenção de voto em algumas capitais, o professor Leonardo Avritzer identifica uma relação entre a chance de reeleição e o desempenho do prefeito no combate ao coronavírus.
De fato, trabalhos bem avaliados durante a pandemia devem ajudar mandatários neste ano, especialmente porque, mais uma vez, a saúde foi apontada como o principal problema dos municípios em pesquisas do Ibope em várias capitais brasileiras.
* Lucas Gelape é doutorando em Ciência Política pela USP e mestre pela UFMG. Foi pesquisador visitante (doutorado sanduíche) na Universidade Harvard.
por Leonardo Avritzer | out 14, 2020 | Cidades, Destaque 1, Geral, Opinião Pública
Desde as eleições de 2016, é possível observar um padrão de voto por parte do eleitor brasileiro, tanto em eleições municipais quanto em eleições estaduais. Como resultado de uma crítica ao establishment político e aos partidos, esse eleitor passou a se preocupar muito mais com a aparência física dos candidatos e com certo discurso anticorrupção e não se atentou muito à capacidade que os vereadores, deputados, prefeitos e até mesmo governadores eleitos teriam de formular e implantar políticas.
Uma pergunta importante para a eleição de 2020 é se esse padrão irá ou não mudar em virtude da pandemia do novo coronavírus. Afinal vimos tanto experiências de forte empenho no combate à pandemia quanto prefeitos e governadores que se eximiram de adotar medidas contundentes e não foram capazes de controlá-la.
Belo Horizonte e Florianópolis: aparentemente imbatíveis
Temos motivos para assumir que o padrão irá se alterar a partir de 2020. Ainda que não em todos os lugares. Alguns exemplos já podem ser percebidos, como o caso do prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD), e do prefeito de Florianópolis, Gean Loureiro (DEM).
Alexandre Kalil foi um dos prefeitos a implementar as políticas mais radicais contra o coronavírus, tornando Belo Horizonte a primeira cidade a adotar medidas de isolamento social, em 17 de março, como também uma das poucas a retornar ao isolamento em virtude do aumento da taxa de contaminação após a abertura do comércio.
Até hoje, a capital mineira não reabriu completamente seus restaurantes e escolas. O prefeito de BH, mesmo com implementação de políticas tão incisivas de combate à pandemia, disparou na frente de outros candidatos na corrida eleitoral pela reeleição. De acordo com a pesquisa IBOPE do dia 02 de outubro Kalil possui 56% das intenções de voto.
Situação semelhante ocorre em Florianópolis, onde o atual prefeito tem 44% de votos e seu desempenho contra a pandemia vem sendo bem avaliado pela população. No entanto, uma pergunta ainda se coloca: os casos dos prefeitos de Belo Horizonte e de Florianópolis são casos isolados ou seria um novo padrão a ser observado nas eleições deste ano?
Combate a pandemia parece ser relevante, mas não sozinho
Comparando a atuação de alguns prefeitos a partir de três critérios, a saber, a política em relação à reabertura do comércio, em relação a restaurantes e escolas e seus posicionamentos públicos, podemos avaliar a reação à pandemia entre intensa, média, baixa e muito baixa. Na tabela abaixo, observa-se também a intenção de voto.
Tabela 1: intenção de voto e reação à pandemia
Os casos marcados em verde-escuro apontam para aqueles prefeitos que tiveram atitudes incisivas no combate à pandemia. Os dois mencionados anteriormente, Alexandre Kalil (Belo Horizonte) e Gean Loureiro (Florianópolis), são praticamente imbatíveis, segundo os números atuais. Dados os impactos e a relevância do tema sanitário na conjuntura, isso indica certo alinhamento da população às atitudes dos prefeitos.
As certezas, no entanto, acabam aí. Por um lado, o caso de Bruno Covas já levanta algumas dúvidas sobre essa correlação. O prefeito paulistano, que em 2016 foi vice de João Dória, agora está como candidato pelo PSDB e em segundo lugar na pesquisa, perdendo apenas para Russomano (Republicanos) que tem 26% dos votos. Ainda que esteja perdendo para um candidato apoiado pelo presidente Jair Bolsonaro, figura que teve uma atuação na pandemia contrária ao que aqui consideramos como exemplar, o prefeito tem chances de reeleição dado o histórico de perda de fôlego de Russomano.
Por outro lado, há dúvidas se a péssima intenção de votos em relação ao prefeito Marcelo Crivella (Republicanos) deve-se unicamente a sua atuação frente à pandemia. Provavelmente não, já que ele acumulava um desempenho muito ruim em um conjunto de áreas de sua administração antes mesmo do início da pandemia.
Resta explicar, portanto, os casos intermediários. Prefeitos que antes da pandemia eram frágeis e tiveram atitudes médias – apontando para mais de uma direção em termos de medidas intensas e de pouca atenção à severidade da crise – parecem ter os maiores problemas em relação a corrida eleitoral.
Esse é o caso principalmente do atual prefeito de Porto Alegre e candidato à reeleição, Nelson Marchezan Júnior. Corre contra ele um processo na Câmara dos Vereadores por desviar recursos de combate à Covid-19 para outras áreas. Recife teve um momento muito ruim no início da pandemia mas se recuperou bem ao passo que Porto Alegre tem um desempenho ruim que se manteve, especialmente se comparado às duas outras capitais da região Sul.
Vale a pena também apontar a baixíssima taxa de reeleição no estado do Rio Grande do Sul e que deve também afetar Marchezan, um candidato que se beneficiou da onda de boa aparência somada ao discurso anticorrupção em 2016, mas que parece não conseguir se reeleger apenas com base neste binômio.
Por último, temos um caso que não se enquadra completamente em nossa tipologia, que é Cuiabá. Por um lado, o desempenho frente à Covid–19 do prefeito Emanuel Pinheiro parece ser muito ruim, mas, por outro lado, ele tem alta intenção de votos. O caso de Cuiabá mostra que a pandemia é relevante, mas não foi e não será capaz de ser o único item nas agendas das eleições deste ano. Continuarão existindo pautas e lideranças regionais. Porém, aqueles prefeitos que conseguiram associar um bom desempenho anterior com um bom desempenho na gestão da pandemia parecem ter maiores chances de reeleição.